São Paulo, sexta-feira, 26 de março de 2010

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CINEMA

Crítica/ "Os Homens que Encaravam Cabras"

Time de astros estrela comédia morna, mas de premissa bem interessante

RICARDO CALIL
CRÍTICO DA FOLHA

Nos primeiros minutos de "Os Homens que Encaravam Cabras", fica difícil espantar a sensação de estar vendo uma comédia dos irmãos Coen. George Clooney de bigode e expressão abobalhada como em "E aí, Meu Irmão, Cadê Você?" (2000), Jeff Bridges em um papel muito parecido ao Dude de "O Grande Lebowski" (1998), personagens que se metem em situações improváveis sem se dar conta do absurdo que os cerca... tudo leva a crer que se trata de um Coen legítimo.
Mas logo fica claro que Grant Heslov, o diretor de "Os Homens que Encaravam Cabras" (também ator e roteirista de "Boa Noite e Boa Sorte"), pode até emular o cinismo da dupla de cineastas, mas não sua imaginação. E olha que seu filme tinha um ponto de partida espetacular: o livro de Jon Ronson que investiga as experiências reais do exército americano com a paranormalidade, a cultura new age ou com o puro nonsense -como matar cabras com o olhar, atravessar paredes de concreto, tornar-se invisível e usar canções infantis para torturar os inimigos.
Heslov usa esses dados reais para criar uma sátira ficcional, sobre um repórter (Ewan McGregor) que, após ser traído pela mulher, decide cobrir a Guerra do Iraque para encontrar uma história que desse uma guinada em sua vida. Ele conhece um ex-oficial do Exército (Clooney) que foi a estrela de uma unidade de espiões paranormais que se identificavam como guerreiros Jedi e acreditavam poder terminar uma guerra com o poder da mente.
Com uma premissa tão extraordinária e um elenco de astros com timing cômico, Heslov consegue criar bons momentos isolados de humor -como nas cenas em que o coronel hippie ensina seus duros comandados a dançar ou coloca LSD no tanque de água de um batalhão. São truques antigos, fáceis, mas ainda funcionais.
No geral, porém, fica a sensação de desperdício de um belo material. Heslov cria uma sátira morna, pouco incisiva, que hesita entre atacar o absurdo do militarismo ou o patético do misticismo. Nunca se sabe se ele nutre um desprezo maior pelos falcões da guera ou pelas pombas da paz. As duas frentes de batalha do filme se igualam -e terminam por se anular.
Recentemente, os Coen mostraram o caminho para uma boa sátira ao militarismo em "Queime Depois de Ler" (2008). Mas o maior exemplar desse filão continua sendo "Dr. Fantástico" (1964), de Stanley Kubrick. Mas são comparações injustas. Se Heslov não conseguiu se mostrar um bom discípulo dos Coen, como exigir que esteja à altura de Kubrick?


OS HOMENS QUE ENCARAVAM CABRAS

Diretor: Grant Heslov
Produção: EUA, 2009
Com: George Clooney, Ewan McGregor
Onde: Espaço Unibanco Pompeia, Reserva Cultural e circuito
Classificação: 16 anos
Avaliação: regular




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