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CRÍTICA
Publicidade não pode se pretender ingênua
BIA ABRAMO
COLUNISTA DA FOLHA
Desta vez , foram os educadores que protestaram. O
"xis" da questão é uma propaganda da Volkswagen que estimularia a cola: em uma sala de
aula, meninas tentam espiar o
exercício dos colegas. Dois garotos recusam e recebem olhares de
reprovação; um terceiro, ao contrário, levanta o braço e deixa a
colega olhar. Sob os dois primeiros, uma legenda explica que serão engenheiros de empresas
concorrentes da Volks; o terceiro, será um futuro profissional
da empresa.
É tão eloquente em relação a
estereótipos e preconceitos que
dá preguiça: o respeito à regra é
coisa de alemão e o jeitinho com
pitadas de contravenção, brasileiro, meninos tornam-se engenheiros enquanto meninas conquistam na base do charme; a
imagem da situação escolar como ambiente opressivo que só os
otários levam a sério e por aí vai.
Educadores reclamaram, a
Volkswagen dá uma desculpa
ótima: que a situação representada no comercial não seria de prova e sim, de exercício em sala de
aula. Como se se não estivesse na
situação formal de prova, a "falta" ficasse atenuada - qualquer
professor diria que não faz a menor diferença.
Ainda segundo a montadora,
"o objetivo do comercial é mostrar que as outras marcas alemãs
são tão boas quanto a Volkswagen, [...] mas são exclusivistas.
Como conclui o filme, a tecnologia da Volkswagen está ao alcance de todos". A defesa é capenga
demais e não consegue responder a contento a questão: por que
é que a publicidade flerta com a
deseducação e os preconceitos?
O anúncio da Volkswagen é só
mais um entre muitos que se utiliza, mais ou menos levianamente, de imagens e situações em que
se mostram comportamentos
moralmente discutíveis, para dizer o mínimo. De certa forma,
como eles, os publicitários costumam se justificar, poderia parecer que não é nada além do que já
acontece em termos sociais ou
seja, refletiria uma crise pesada (e
bota pesada nisso) de valores etc.
Esse argumento "realista" talvez
colasse, mas só se a gente não
lembrasse que propaganda não
é, como querem fazer acreditar
os publicitários, arte.
Há um grau de intencionalidade (e, portanto, de controle) na
elaboração de uma peça publicitária que afasta qualquer possibilidade de representação simplesmente. Ao representar, a publicidade carrega cada detalhe de valores -afinal, o anúncio serve
para distinguir um produto entre
outros, para convencer que "a" é
melhor que "b", que isso deve ser
consumido, e aquilo não, e assim
por diante.
A publicidade, portanto, não
tem o direito de se pretender ingênua. Ela serve para que o consumidor faça escolhas bem diretas, bem específicas e, nesse sentido, quando abandona o simplismo (compre o produto tal) e
parte para os chamados conceitos, acaba por se constituir como
uma das formas mais veementemente morais que circulam hoje
em dia. O que, evidentemente, é
um problema e grande.
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