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ARTES PLÁSTICAS
"Modernidad Brasil", em Lima, apresenta obras modernistas raramente exibidas por aqui
Peru vê o que o Brasil ainda pouco viu
CELSO FIORAVANTE
enviado especial a Lima
"Foi preciso vir a Lima para que
eu visse tão bons quadros da nossa pintura", escreveu o presidente
Fernando Henrique no livro de
honra do museu Pedro de Osma,
em Lima (Peru), depois de inaugurar a mostra "Modernidad Brasil", na última quinta-feira.
O presidente está certo. As cerca
de 50 obras apresentadas (pinturas, esculturas e xilogravuras) são
uma boa seleção do que de melhor o país produziu entre os anos
10 e 40 e exemplificam tanto os cânones europeus que influenciavam a produção brasileira no período quanto o rompimento com
eles e o consequente início de
uma identidade pictórica nacional.
O fato de o presidente ter se espantado com o conjunto apresentado também é explicável. Vários
trabalhos pertencem a coleções
particulares e poucas vezes foram
apresentados publicamente.
Da musa modernista Tarsila do
Amaral, por exemplo, a exposição
conta com a tela "Composição"
(1930), que apresenta uma figura
feminina de costas, com cabelos
que atravessam horizontalmente
toda a tela, observando uma paisagem estilizada. O trabalho é um
dos últimos de seu período antropofágico, caracterizado pela absoluta simplificação do campo visual, pelo uso de massas de cor e
pela luminosidade das cenas.
Anita Malfatti, sua contemporânea, comparece com "O Homem
Amarelo" (1915/16), ícone do modernismo que gerou o artigo "Paranóia ou Mistificação" (1917),
em que Monteiro Lobato criticou
as inovações modernistas da obra
e de sua autora. Também está na
mostra a tela "Ventania" (1915),
em que se nota ainda sua ligação
com movimentos europeus, como o expressionismo de Van
Gogh, fato notado pelo presidente. "Esse parece um Van Gogh",
disse Fernando Henrique ao presidente do Peru, Alberto Fujimori, que o acompanhou na visita.
Além dos dois, estavam presentes
na abertura Edemar Cid Ferreira,
presidente da Associação Brasil
500 Anos (que organizou a mostra), e os diretores Pedro Paulo de
Sena Madureira e Beatriz Pimenta
Camargo (que cedeu à mostra
uma tela de Guignard de sua coleção).
O expressionismo do pintor holandês é apenas uma das referências detectáveis na mostra. A arte
decô comparece na escultura em
mármore "Crucificado", de Victor Brecheret, e nas telas de Antonio Gomide ("Retrato de Vera Vicente de Azevedo") e Vicente do
Rego Monteiro ("Mulher Sentada" e "O Arqueiro"). O surrealismo está em "Ascensão Definitiva
de Cristo", de Flávio de Carvalho.
E o cubismo se nota em "A Tocadora de Guitarra", outra escultura
de Brecheret, e na tela "Noivos",
de Ismael Nery, artista de destaque do evento.
Apesar de ter vivido apenas 33
anos (morreu em 1934), Nery foi
uma espécie de multihomem.
Além de pintor e exímio desenhista, também foi poeta, filósofo,
bailarino e figurinista, entre outras coisas. Tamanho talento, porém, foi injustiçado em vida e
continua pouco lembrado depois
de sua morte, embora a mostra
venha lhe fazer justiça. Ele comparece com duas telas magistrais.
"Noivos" é cubista por excelência. Parece ter saído dos próprios
pincéis de Picasso, seja pelos traços certeiros do desenho (o rapaz
tem perfil helênico, como em vários trabalhos do espanhol), seja
pelo erotismo do tema (outra obsessão de Picasso), seja pela predomínio da cor azul na cena ou
ainda pela balanceada composição, em que os dois corpos ocupam parte da mesma superfície,
criando assim uma ilusão de volume e movimento na tela plana
(uma característica do cubismo).
Nery também está representado
com a extremamente erótica
"Mulher Sentada com um Ramo
de Flores", em que uma jovem seminua repousa, lânguida, sobre
poltrona vermelha, com um fálico
ramo de flores nas mãos, propositalmente disposto em direção à
sua semi-encoberta vagina.
Curada por Nelson Aguilar, a
mostra traz ainda trabalhos de Di
Cavalcanti, Volpi, Lasar Segall, Lívio Abramo, Maria Martins,
Goeldi, Portinari e Cícero Dias.
O jornalista Celso Fioravante viajou a Lima
a convite da Associação Brasil 500 Anos
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