São Paulo, segunda-feira, 26 de dezembro de 2005

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CINEMA/CRÍTICA

Diretor sueco banaliza Bergman em trama musical

PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA

A Suécia deu ao mundo o cineasta Ingmar Bergman, o grupo musical Abba e, agora, "A Vida no Paraíso", um filme que, creiam, reúne o que há de pior nos dois. De Bergman vem o conteúdo dramático-psicanalítico e o tema da repressão religiosa, que, desvinculados da forma rigorosa do cineasta, banalizam-se automaticamente. Do Abba vem o tratamento sentimental e grudento dado à música, sem direito à diversão das pistas de dança.
Poucas palavras sobre a trama são suficientes para que se adivinhe o que vem pela frente. Um maestro em crise volta à pequena cidade onde viveu até os sete anos para reciclar sua vida. Na infância, como explicam os flashbacks, ele apanhava dos coleguinhas da escola. Até que sua mãe o tirou dali e lhe deu a chance de se transformar em um rico e bem-sucedido maestro, daqueles que suam e até sangram (!) diante da orquestra.
Esgotado pela pressão do meio musical e pela agenda desumana dos concertos, o maestro volta à cidade natal sem dizer que já vivera ali. Em pouco tempo, ele assume a direção do pequeno coral protestante. Então, adivinhe: 1) o que a música provocará nos cidadãos do coro; e 2) o que a música provocará nos setores mais conservadores da cidade.
"A Vida no Paraíso" jaz no superlotado cemitério das imagens natimortas, lá onde são enterrados os filmes que seguem direto para o inferno das boas intenções. Incomoda, sobretudo, um certo determinismo subjacente à história (o garoto que mais batia no maestro se transformou em um brutal motorista de caminhão que espanca a mulher, ou seja, crianças violentas tornam-se adultos violentos; as sensíveis, maestros) e também aquela crença religiosa no poder redentor da música.
A principal crítica que o diretor Kay Pollak tenta imprimir -uma postura anticristã- é negada pela própria forma do filme, ao reforçar a crença na redenção e transformar o maestro em uma espécie de Cristo contemporâneo.


A Vida no Paraíso
Sä Som I Himmelen
 
Direção: Kay Pollak
Produção: Suécia, 2004
Com: Michael Nyqvist, Frida Hallgren


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