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Comida
Mestre do salão
Dono do La Tambouille, que completa 35 anos, Giancarlo Bolla relembra sua trajetória e visita lugares importantes em sua história
RACHEL BOTELHO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Giancarlo Bolla, 65, é uma
das personalidades mais emblemáticas da gastronomia
paulistana. No mês em que seu
restaurante La Tambouille comemora 35 anos, o italiano de
San Remo relembra o início da
carreira em São Paulo, revê alguns locais que fazem parte de
sua história em um passeio a
convite da Folha e saúda a evolução gastronômica ocorrida
na cidade nas últimas cinco décadas. Mas não se ilude: "A essência da cozinha de hoje é a
mesma de então", afirma.
Sua trajetória permite entrever um passado ao mesmo
tempo recente e longínquo, em
que o chef tinha vergonha de
deixar a cozinha trajando o jaleco, e o maître era o astro da
casa. Não por acaso, foi no salão que Bolla se notabilizou, e é
lá que continua ainda hoje recebendo seus clientes.
Nascido em 1940, esse homem de voz suave que aparenta 15 anos a menos teve as primeiras aulas de cozinha com a
mãe, ainda criança. Nas férias
escolares, graças à proximidade dos balneários da Riviera,
começou a trabalhar como garçom em bares e restaurantes da
região, próxima à fronteira
com a França.
Aos 17, emigrou para São
Paulo com a família para contornar as dificuldades do pós-guerra. O pai veio primeiro e,
após uma estada em Buenos
Aires, se estabeleceu na cidade.
Ao desembarcar no Brasil, Bolla já falava três idiomas e logo
aprendeu o português. O primeiro emprego foi como ajudante, no extinto Roma.
Durante o passeio, na tarde
de segunda-feira, o carro da reportagem pára em frente ao local onde era o Baby Beef Rubaiyat, na avenida Vieira de Carvalho. Ali, onde foi promovido a
garçom, Bolla vê o imóvel ocupado por um estacionamento e
recorda a atmosfera da época.
"Tudo girava em torno da praça
da República, o lugar mais
charmoso do centro."
Ao sair do Rubaiyat, conseguiu trabalho como garçom no
restaurante do hotel Ca'd'Oro,
atualmente na rua Augusta.
"Fiquei seis anos ali, onde
aprendi tudo sobre salão. O
chef Emílio Locatelli, de quem
fiquei amigo, me ensinou a cozinhar de verdade", conta. Foi
no hotel, um dos melhores de
sua época, que ele chegou a
maître, aos 24 anos. "Giancarlo
superou o mestre", elogia Aurélio Guzzoni, herdeiro do proprietário, num reencontro nos
salões clássicos do hotel.
Nos idos de 1960, a função do
maître era um tanto diferente.
A comida chegava ao salão em
recipientes tampados, e ele se
encarregava de servir os comensais. A cada quatro mesas,
havia um réchaud com todos os
utensílios necessários, além de
fogo, para finalizar os pratos
em frente aos clientes. "Isso
mudou com a chegada da cozinha asiática no Ocidente, porque se percebeu a importância
da beleza na preparação", diz.
Depois de outra passagem
pelo salão do Rubaiyat, em 1971
decidiu partir em vôo solo.
"Quando abri o La Tambouille,
na avenida Cidade Jardim,
pensaram que eu era louco. Os
restaurantes ficavam todos no
centro, e o bairro era bem residencial. Mas achei que seria o
futuro de São Paulo", conta, satisfeito com sua intuição.
No final daquela década, em
sociedade com José Victor Oliva e Ugo di Pace, o restaurateur
ajudou a conceber aquele que
seria um dos maiores clubes
noturnos da história da cidade.
Projetado pelo arquiteto Sig
Bergamin, o Gallery atraiu toda
uma gama de "bem-nascidos" e
endinheirados e marcou época.
Outras casas se sucederam,
como O Leopolldo, o Bar des
Arts e o Leopolldina, os três
ainda na ativa. Em todas as
ocasiões, a tarefa de supervisionar a cozinha e receber os
clientes foi delegada a Bolla.
"Sou um restaurateur, porque
entendo de comida, salão, iluminação, flores, atendimento,
ar-condicionado, bebidas e decoração." É assim que ele deixa
sua marca na gastronomia.
LA TAMBOUILLE
Onde: av. Nove de Julho, 5.925,
Itaim Bibi, tel. 0/xx/11/3079-6277
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