São Paulo, quinta-feira, 27 de julho de 2006

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Comida

Mestre do salão

Dono do La Tambouille, que completa 35 anos, Giancarlo Bolla relembra sua trajetória e visita lugares importantes em sua história

RACHEL BOTELHO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Giancarlo Bolla, 65, é uma das personalidades mais emblemáticas da gastronomia paulistana. No mês em que seu restaurante La Tambouille comemora 35 anos, o italiano de San Remo relembra o início da carreira em São Paulo, revê alguns locais que fazem parte de sua história em um passeio a convite da Folha e saúda a evolução gastronômica ocorrida na cidade nas últimas cinco décadas. Mas não se ilude: "A essência da cozinha de hoje é a mesma de então", afirma.
Sua trajetória permite entrever um passado ao mesmo tempo recente e longínquo, em que o chef tinha vergonha de deixar a cozinha trajando o jaleco, e o maître era o astro da casa. Não por acaso, foi no salão que Bolla se notabilizou, e é lá que continua ainda hoje recebendo seus clientes.
Nascido em 1940, esse homem de voz suave que aparenta 15 anos a menos teve as primeiras aulas de cozinha com a mãe, ainda criança. Nas férias escolares, graças à proximidade dos balneários da Riviera, começou a trabalhar como garçom em bares e restaurantes da região, próxima à fronteira com a França.
Aos 17, emigrou para São Paulo com a família para contornar as dificuldades do pós-guerra. O pai veio primeiro e, após uma estada em Buenos Aires, se estabeleceu na cidade. Ao desembarcar no Brasil, Bolla já falava três idiomas e logo aprendeu o português. O primeiro emprego foi como ajudante, no extinto Roma.
Durante o passeio, na tarde de segunda-feira, o carro da reportagem pára em frente ao local onde era o Baby Beef Rubaiyat, na avenida Vieira de Carvalho. Ali, onde foi promovido a garçom, Bolla vê o imóvel ocupado por um estacionamento e recorda a atmosfera da época. "Tudo girava em torno da praça da República, o lugar mais charmoso do centro."
Ao sair do Rubaiyat, conseguiu trabalho como garçom no restaurante do hotel Ca'd'Oro, atualmente na rua Augusta. "Fiquei seis anos ali, onde aprendi tudo sobre salão. O chef Emílio Locatelli, de quem fiquei amigo, me ensinou a cozinhar de verdade", conta. Foi no hotel, um dos melhores de sua época, que ele chegou a maître, aos 24 anos. "Giancarlo superou o mestre", elogia Aurélio Guzzoni, herdeiro do proprietário, num reencontro nos salões clássicos do hotel.
Nos idos de 1960, a função do maître era um tanto diferente. A comida chegava ao salão em recipientes tampados, e ele se encarregava de servir os comensais. A cada quatro mesas, havia um réchaud com todos os utensílios necessários, além de fogo, para finalizar os pratos em frente aos clientes. "Isso mudou com a chegada da cozinha asiática no Ocidente, porque se percebeu a importância da beleza na preparação", diz.
Depois de outra passagem pelo salão do Rubaiyat, em 1971 decidiu partir em vôo solo. "Quando abri o La Tambouille, na avenida Cidade Jardim, pensaram que eu era louco. Os restaurantes ficavam todos no centro, e o bairro era bem residencial. Mas achei que seria o futuro de São Paulo", conta, satisfeito com sua intuição.
No final daquela década, em sociedade com José Victor Oliva e Ugo di Pace, o restaurateur ajudou a conceber aquele que seria um dos maiores clubes noturnos da história da cidade. Projetado pelo arquiteto Sig Bergamin, o Gallery atraiu toda uma gama de "bem-nascidos" e endinheirados e marcou época.
Outras casas se sucederam, como O Leopolldo, o Bar des Arts e o Leopolldina, os três ainda na ativa. Em todas as ocasiões, a tarefa de supervisionar a cozinha e receber os clientes foi delegada a Bolla. "Sou um restaurateur, porque entendo de comida, salão, iluminação, flores, atendimento, ar-condicionado, bebidas e decoração." É assim que ele deixa sua marca na gastronomia.


LA TAMBOUILLE
Onde:
av. Nove de Julho, 5.925, Itaim Bibi, tel. 0/xx/11/3079-6277


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