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COMENTÁRIO
Entre o recolhimento e a superexposição
NAIEF HADDAD
EDITOR-ASSISTENTE DA ILUSTRADA
Maio de 2000: a cantora
Björk é premiada como a
melhor atriz no Festival de Cannes por sua participação em
"Dançando no Escuro", de Lars
von Trier. Satisfeita (ou entediada), afasta-se do cinema.
Fevereiro de 2004: em Salvador,
Björk acompanha o companheiro, o artista plástico Matthew Barney, que montava um trio elétrico. Diante dos paparazzi, pouco
fala. Dança escondida. A estrela
ali é Barney.
Agosto de 2004: Björk abre as
Olímpiadas cantando "Oceanic",
do novo CD, "Medúlla". Cerca de
4 bilhões de pessoas a vêem pela
TV com seu longo vestido azul.
Para se aproximar da música de
Björk, vale observar o modo como ela lida com o circo da indústria cultural, domando-o sem negá-lo. A cantora e compositora intercala momentos de superexposição e outros de recolhimento
-e não há um sem a existência
do outro. Vejamos: as músicas de
"Medúlla" nasceram em uma
temporada silenciosa nas ilhas
Canárias. As gravações começaram em Reykjavík, capital da sua
pequena Islândia -é lá onde as
pessoas dizem "olá" a ela com o
descompromisso de velhos conhecidos. E a conclusão do disco
se deu em Londres, onde Björk se
consagrou em carreira solo no
início da década de 90 após três
discos à frente do Sugarcubes e
hoje é idolatrada.
Nesse ziguezague de ocultar e
expor, Björk dá um passo adiante:
leva sua instropecção e seus mistérios a público, sem jogo de cena.
Sua Selma do filme de Von Trier
atesta uma angústia que transita
entre a vida e a ficção, como se
Björk e Selma fossem sempre
uma só. Na clássica "Hyperballad", do segundo disco, "Post",
evoca o suicídio pra delinear uma
ode à existência. As cortinas se
abrem para a intimidade, que está
lá, recolhida no canto do palco.
E assim, como se não bastasse
sua voz dissonante, suas influências múltiplas, Björk confunde e
assusta em público ao desvelar o
privado, sem medo.
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