São Paulo, sábado, 27 de agosto de 2005

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LIVROS

ROMANCE


Autor de "Minha Vida, Uma Farsa" comenta universo pós-colonial britânico

Para Peter Carey, escrever é "falhar na maioria dos dias"

DA REPORTAGEM LOCAL

Leia abaixo a continuação da entrevista com o escritor australiano Peter Carey. (MS)

 

Folha - Seu livro, como os anteriores, é uma reflexão sobre a identidade australiana...
Peter Carey -
Acho que o passado colonial ainda é muito próximo, está dentro de nós de várias formas. Tudo ainda está por ser feito. Não sabemos de fato quem somos. É uma oportunidade maravilhosa para um artista. É muito libertador e difícil de fazer. Meu avô, que nunca tinha ido para o Reino Unido, se referia à Inglaterra como a sua casa...

Folha - A ação se passa na Austrália, em Londres e na Malásia. Você queria revolver o passado colonial?
Carey -
Era interessante ter a figura do poeta inglês, um sujeito que representa um certo esnobismo britânico. Quando pensei no monstro, o poeta inventado que iria raptar a menina, pensei numa perseguição. Queria que ele não conhecesse as palavras, e a Malásia era uma boa idéia. Também queria usar a floresta, os nomes das plantas desconhecidas. Achei que isso seria um pouco assustador. Também vi pessoas com doenças típicas da região e isso me levou à figura do fraudador.

Folha - Você mora em Nova York há 15 anos...
Carey -
[risos] Eu não planejei isso. Vou levando um dia depois do outro... Continuo ligado à Austrália. Uma das vantagens é que acabamos tendo uma visão mais crítica, vemos o país mudar.

Folha - Você é um dos dois únicos autores a ter recebido duas vezes o Booker Prize. Não há uma pressão para que escreva grandes obras? Não é um peso ter essa distinção?
Carey -
Nem consigo descrever como é leve esse peso [risos]. Escrever um livro é muito difícil, significa falhar na maioria dos dias. A complicação e a dificuldade em se inventar já é suficiente. Realmente não há espaço para se pensar em mais nada, em como as pessoas vão reagir ou o que vão achar do seu livro. Acho que se me preocupasse com isso, não conseguiria escrever. De fato, quando tinha os meus 20 anos, achava que meus pais nunca leriam o que eu escrevia, o que de fato aconteceu [risos].

Folha - Você fez o roteiro de "Até o Fim do Mundo", de Wim Wenders. Não pensa mais em cinema?
Carey -
Não tenho intenção de trabalhar nessa área. Fiz a adaptação para o cinema de um livro do meu amigo Paul Auster, "The Locked Room" [o quarto trancado, um dos três contos que integram o livro "A Trilogia de Nova York"]. Ficamos contentes com o roteiro, mas o filme não foi feito. Foi logo após "Cortina de Fumaça" (95) e "Sem Fôlego" (97), de Wayne Wang. Ele iria dirigir. Escrevo livros e fico feliz em não ter pessoas dizendo o que está errado neles... "Até o Fim do Mundo" é um filme de Wim Wenders. Ele é um cara legal, foi uma experiência divertida, mas é um filme dele...


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