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Crítica/dvd/"Naked"
Em clima de ressaca, filme de Mike Leigh explora uma Londres sombria
KLEBER MENDONÇA FILHO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Chama a atenção que
"Naked" (1993), de Mike Leigh, finalmente
veja a luz do dia no Brasil meses
após o lançamento nos cinemas
de "Simplesmente Feliz"
(2008). "Naked" sai agora em
DVD sem nunca ter sido distribuído nas salas. É a crônica
mais sombria de Leigh, contrastando com o último, sua
obra mais risonha.
Premiado no Festival de
Cannes com direção e ator (David Thewlis) dois anos antes da
Palma de Ouro para Leigh por
"Segredos e Mentiras" (1996), o
tom de "Naked" lembra o de
uma ressaca.
E, como ocorre em ressacas,
o mal-estar é forte, mas a sensação de estar vivo também. O
filme segue algo de bêbado e
nublado, com espasmos de sobriedade tocante, um pouco como a própria Londres.
O eixo da trama é Johnny
(David Thewlis). Ele faz parte
de uma galeria peculiar de ingleses, como o Alex de "Laranja
Mecânica" (1971), o skinhead
Trevor de "Made in Britain"
(1984), ou Francie Brady, o
proto-punk mirim de "Nó na
Garganta" (1997). São agentes
do caos com sensibilidades insuspeitas.
Charme pós-punk
Aos 27, Johnny é maduro o
suficiente para entender um
suposto mau humor de Deus e
ainda jovem o bastante para
odiar isso.
Nos seus piores momentos,
tem a verve de um poeta marginal afiado. É um chato com alguma razão que explica sua má
aparência como tentativa de
mesclar-se aos ambientes.
Chega na casa da ex-namorada, Louise (Lesley Sharp), que
divide o espaço com a sempre
aérea Sophie (Katrin Cartlidge,
que morreu precocemente em
2002). O charme pós-punk de
Johnny leva o trio a um colapso
imediato.
Ele sairá pela cidade numa
odisseia de encontros fortuitos
que, mesmo lembrando "Depois de Horas" (1986), de Martin Scorsese, ainda soa notável
e original. Se na noite nova-iorquina de Scorsese o personagem é passivo, na noite londrina de Leigh Johnny é o motor
de tensões constantes.
Essa dureza tem na fala uma
verdade britânica notável, aspecto também percebido em
"Kes" (1969), de Ken Loach,
outro momento importante do
cinema britânico lançado há
pouco pela mesma distribuidora Lume Filmes.
Como Loach, Mike Leigh
destaca o som do falar na Grã-Bretanha com ouvidos abertos.
O trio Johnny, Louise e Sophie,
o casal de escoceses na rua e o
outro personagem masculino
em cena, Jeremy (Greg Cruttwell), assumem visões de mundo e de classes sociais em sonoridades peculiares da paisagem
britânica.
NAKED
Distribuição: Lume Filmes
Quanto: R$ 39,90, em média
Classificação: 18 anos
Avaliação: ótimo
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