São Paulo, quinta-feira, 27 de outubro de 2011

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Companhia das Letras, 25, aposta em seleção brasileira

Editora faz um quarto de século empenhada em grandes autores nacionais

Publicação de Drummond é novo lance de processo iniciado nos anos 2000, que se reflete em aumento de vendas para governos

FABIO VICTOR
DE SÃO PAULO

Seu primeiro best-seller foi de um americano, Edmund Wilson, "Rumo à Estação Finlândia". Seu campeão de vendas até hoje é um norueguês, Jostein Gaarder, com "O Mundo de Sofia".
E os estrangeiros continuam a dominar seu catálogo -75% do total.
Mas talvez a maior novidade da Companhia das Letras aos 25 anos, completados hoje, seja o crescente fervor por grandes autores brasileiros.
A publicação da obra de Carlos Drummond de Andrade, a partir do ano que vem, é o lance mais ousado de um processo iniciado nos anos 2000. A editora, que já tinha então em seu catálogo Vinicius de Moraes, adquiriu os direitos das obras de Erico Verissimo (em 2002), Jorge Amado (2007) e Lygia Fagundes Telles (2008).
Não há indicação de que a escalada tenha cessado.
Instado pela reportagem a nomear genericamente autores que gostaria de ter em seu time, o fundador e editor da Companhia das Letras, Luiz Schwarcz, citou somente escritores nacionais -Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Graciliano Ramos, Manuel Bandeira.
Alertado da coincidência, emendou: "Nacionalismo e literatura não combinam. Não quero passar a ideia de que editar [Jorge Luis] Borges, Ian McEwan, Georges Perec, Italo Calvino etc esteja abaixo no nosso trabalho, de jeito nenhum."

PARADIDÁTICOS
Fato é que a editora se aprimorou para abrigar sua seleção brasileira.
Possui um departamento exclusivo para atendimento aos professores. Faz seminários de capacitação, tem profissionais que visitam escolas e produz caprichados manuais de orientação para o trabalho em sala de aula das obras dos seus autores nacionais mais clássicos.
Em outra frente, criou, em 2009, a Claro Enigma, editora voltada ao mercado de obras paradidáticas.
O reflexo imediato dessas ações coordenadas foi o aumento nas vendas de livros para o governo.
A casa não informa seu faturamento. Schwarcz diz que a editora cresce cerca de 15% ao ano. As vendas para o governo representam, segundo ele, de 20% a 25% do total das receitas, chegando no máximo a 30%.
Antes de ter no catálogo autores brasileiros consagrados, esse percentual, estima, não passava de 10%.
A evolução tornou a Companhia das Letras uma das editoras brasileiras do segmento de obras gerais (exclui livros didáticos, técnicos e religiosos) que mais vendem ao governo, segundo dados levantados pela reportagem.
A Secretaria de Educação de São Paulo informou que desde 2007 a Companhia recebeu R$ 19 milhões do Governo do Estado, que comprou 3,3 milhões de livros, sem no entanto dar o ranking das campeãs de vendas.
Já pelo PNBE (Programa Nacional Biblioteca da Escola, do Ministério da Educação), a Companhia e a Claro Enigma venderam, juntas, R$ 4,5 milhões em 2010 e 2011, colocando-as entre as campeões do ranking no período.
A mesma situação ocorre nos programas de livro e leitura da Fundação Biblioteca Nacional, vinculada ao Ministério da Cultura, dos quais a Companhia recebeu R$ 3,7 milhões desde 2007.
Não à toa, três autores nacionais estão entre os mais vendidos da história da editora (veja quadro abaixo).
Schwarcz elogia as políticas públicas para livro e leitura do governo federal, ou o que chama de "16 anos de uma política estável de investimento em bibliotecas".
Diz que sua editora busca "apostar no crescimento educacional" brasileiro e revela que se prepara para viajar o país divulgando seu time de autores a secretarias estaduais, para que a casa deixe "de ser passiva nessas compras".
Conta que, pela primeira vez, está com vontade de conversar com um ministro da Educação, "para tentar entender o futuro digital que o governo está projetando" e "ver onde a Companhia pode entrar com esse patrimônio de autores".

ADOTADAS
"Há uns bons 15 anos trabalhamos para ter obras adotadas", afirma Schwarcz, usando o termo que, no jargão, define os livros adquiridas em programas governamentais e admitidos em escolas públicas.
São obras em geral vendidas em grande volume e que, por isso, garantem retorno financeiro, ainda que os descontos sobre o preço de capa sejam colossais.
A presidente do Snel, o sindicato nacional das editoras, Sônia Machado Jardim, fala das especificidades de trabalhar com obras adotadas.
"É quase como ter outro negócio, um segmento dentro do segmento editorial. Você precisa ter divulgação escolar, pois não é um livro vendido para o leitor, mas para o professor", explica.
"É um técnica diferente da usado para o mercado tradicional, em que você vende para o livreiro e para o leitor final", afirma a editora, também vice-presidente de operações do Grupo Record, que perdeu Drummond e Jorge Amado para a Companhia.
A condição não impede que Sônia Machado saúde o aniversário da concorrente.
"É uma editora consolidada e respeitada. O sindicato como entidade de classe fica muito satisfeito em ver editoras que entram pra ficar, que não são uma aventura."



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