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Teoria se apóia em pensamento de Foucault para refletir sobre espaço virtual
Obra investiga tecnologias de poder transitório na internet
GISELLE BEIGUELMAN
ESPECIAL PARA A FOLHA
Em "Política em Pedaços ou
Política em Bits", Gustavo
Steinberg investiga as tecnologias
do poder na internet apoiado teoricamente no pensamento de Michel Foucault (1926-1984).
Combinando rigor teórico com
domínio tecnológico, recusa a
possibilidade de entabular uma
reflexão filosófica sobre a internet
sem discutir a materialidade do
espaço virtual, mas se contrapõe à
abordagem tecnicista, que redunda em determinismo da máquina
sobre a história.
Essa opção permite ao autor
afastar-se das posturas apocalípticas, integradas e deslumbradas
que compõem grande parte da
crítica sobre a internet.
Steinberg parte do princípio
que "na rede de computadores as
máquinas não apenas influenciam a formulação dos discursos,
mas os próprios discursos só podem ser criados em conjunto com
as máquinas".
Isso implica a discussão, central
na obra de Steinberg, de compreender os novos agenciamentos entre tecnologias sociais e materiais que produzem e são produzidas pela rede mundial de
computadores e permitem, em
última instância, que ela funcione, se expanda e exista.
Afinal, defende o autor, é o uso
da internet, por milhões de pessoas, nos mais variados campos, o
que dá validade aos protocolos de
transferência de arquivos e dados
e faz com que programas, produtos e funções sejam mantidos,
atualizados ou descartados.
Contudo, destaca Steinberg, é
importante perceber que esse uso
é feito de forma voluntária. A adesão à rede não é imposta nem pelo
mercado, nem pelos Estados. Pode, no máximo, ser estimulada
por eles, mas o que garante sua
operação é a crença e expectativa
de seus usuários de que seus protocolos funcionem.
Protocolos esses que não são
nada além de arquiteturas de sistemas implementados por programas que viabilizam a construção de uma rede descentralizada,
dentro da qual se estabelece um
jogo de poder em que nenhuma
parte do sistema é hegemônica,
mas todas estão conectadas, ainda
que não continuamente.
Mas não estaria aí indicada a
emergência de uma versão atualizada da sociedade disciplinar, cuja eficiência assentava na capacidade de distribuir o poder capilarmente, atingindo uma transparência pan-óptica, dentro da qual
a sociedade seria legível e visível
em todas as suas partes?
Não, mostra o autor. No jogo de
poder pan-óptico, a função da
distribuição visava a manutenção
da segurança pública em nome da
defesa da paz interna da sociedade. No da internet, a tecnologia de
poder mais importante é a manutenção da confiança pública no
funcionamento de seu protocolo.
Uma tecnologia social, portanto, capaz de legitimar protocolos
em um sistema que permite, inclusive, a flexibilização da vigilância, haja vista que vírus, erros de
sistema e falhas de servidores dificilmente comprometem a rede
como um todo.
Conforma-se aí uma tendência
rumo a uma "sociedade ativadora", na qual o controle se exerce
por mecanismos de auto-regulação, capazes de gerar produtividade a partir de partes desorganizadas, mas baseadas em interfaces simbióticas de homens e computadores que são ativadas descontínua e momentaneamente,
configurando uma fluidificação
da política.
Uma política que não diz respeito a fins, mas a poderes transitórios que se manifestam em espaços de interconexão. Uma política, enfim, em pedaços, que nos
impõe, conforme alerta o autor, a
responsabilidade de pensar "interfaces adequadas a fim de navegar em redes desejáveis".
Giselle Beiguelman é autora de "O Livro Depois do Livro" (Fundação Peirópolis), professora do programa de pós-graduação em comunicação e semiótica da
PUC-SP e responsável pelo site
www.desvirtual.com
Política em Pedaços ou Política
em Bits
Autor: Gustavo Steinberg
Editora: UnB
Quanto: R$ 38 (274 págs.)
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