São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

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Mostra exibe corpos e órgãos humanos reais

Peças são fruto de doação da China, foram desidratadas e "plastificadas" quimicamente, ficando maleáveis e sem odor

Exposição é cópia "menos artística" de alemã, que desde os anos 90 gera grande polêmica com estetização dos corpos


EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

A vaca fatiada que Damien Hirst apresentou em Londres, no fim dos anos 90, já foi pro brejo. A exposição "Corpo Humano - Real e Fascinante", que acompanha a mostra dedicada a Leonardo Da Vinci, na Oca do parque Ibirapuera, traz um histórico mais polêmico do que os cortes bovinos do artista plástico inglês, reunindo 16 corpos e 225 órgãos humanos, tratados com uma técnica chamada de polimerização.
"Corpo Humano" é uma das cinco versões -ou cópias- da exposição "Körperwelten" [mundos do corpo], criada nos anos 90 pelo alemão Gunther von Hagens. Existe uma pequena diferença na abordagem. Enquanto Von Hagens assume a estetização dos corpos -entre seus "objetos de arte", ele criou uma "imitação" da "Vênus de Milo com Gavetas", de Salvador Dalí-, a mostra que chega a São Paulo quer se fixar na experiência científica.
"Nossa abordagem é científica e não artística", defende o médico Roy Glover, criador da mostra. "A exposição foi projetada apenas para educar e ajudar as pessoas a aprender sobre seus corpos, por meio da dissecação meticulosa, preservação e exibição respeitosa de corpos humanos de verdade."
O processo de preservação dos corpos e órgãos é conhecido como "plastinação" ou polimerização: o corpo é desidratado e "plastificado" quimicamente, de modo a ficar maleável e sem cheiro.
A disposição das "peças", em nove galerias, começa com o esqueleto, passa pelos sistemas nervoso, circulatório, urinário, digestivo e reprodutivo, compara órgãos sadios e doentes, e termina na seção "O Corpo Tratado". Aqui, Glover exibe próteses e lembra equipamentos usados em cirurgias.
"Temos também uma seção interativa em que os visitantes podem manipular órgãos preservados com polimerização. Isto permite as pessoas sentirem como são e entender melhor seu valor educacional."
Os maiores entusiastas da mostra costumam ser profissionais ou estudantes da área de saúde. Diferente da exposição de Von Hagens, que foi repelida por católicos e evangélicos na Alemanha, "Corpo Humano" não sofreu perseguição de grupos religiosos.
"As poucas pessoas que manifestaram objeção o fizeram por motivos pessoais. A resposta do público tem sido incrivelmente positiva. Até hoje mais de 3 milhões de pessoas visitaram a exposição desde a abertura, em 2004", diz Glover.

Mais polêmica
A estetização dos corpos não é a única polêmica que tem envolvido matriz e cópias da exposição. Mas também a origem dos cadáveres exibidos. A revista alemã "Der Spiegel" chegou a acusar Von Hagens de usar cadáveres de prisioneiros políticos chineses, executados pelo regime do país. Tanto o alemão quanto Glover garantem que os corpos e órgãos que exibem são fruto de doação.
Enquanto as cópias tentam uma abordagem discreta, o midiático Von Hagens faz tudo para aparecer. Fez James Bond "contracenar" com suas "obras" no filme "Cassino Royale". E inaugurou, no fim do ano passado, na cidade alemã de Guben, um "plastinarium" para a fabricação em escala industrial dos corpos humanos polimerizados e animais grandes, como elefantes e girafas.
Em breve, o médico alemão vai vender "fatias" de pato por 100 (cerca de R$ 275) na loja da mostra. Cortes humanos serão vendidos apenas para pesquisa e vão custar bem mais: longitudinais sairão por até 7.000 , quase R$ 20 mil.


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