São Paulo, quarta-feira, 28 de fevereiro de 2007

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TVs resistem a respeitar fusos do país

Governo proíbe que novela das 21h vá ao ar mais cedo em outros Estados; 1/3 das crianças e adolescentes são afetados

Emissoras alegam dificuldade técnica para exibir programas em diferentes horários; exigência da nova portaria entra em vigor em 13 de maio


LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

As redes de TV ainda não começaram a se preparar para cumprir a determinação do governo federal de exibir suas programações de acordo com o fuso horário de cada região. Elas são contrárias à norma, que classificam como censura.
A partir de 13 de maio, quando entra em vigor a nova portaria de classificação de programas de TV, a novela das 21h (não adequada a menores de 14 anos), por exemplo, não poderá mais ir ao ar às 20h em Estados como Roraima, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, e às 19h no Acre e em parte do Amazonas.
No horário de verão, que dura quatro meses, a programação é exibida ainda mais cedo do que o permitido pela classificação do governo. O Nordeste, que não adota o horário de verão, veicula os programas uma hora antes do admitido (a novela das 21h vai ao ar às 20h).
A portaria classifica os programas como não recomendados para antes das 20h (inadequado a menores de 12 anos), 21h (14 anos), 22h (16 anos) e 23h (18 anos). Mais de um terço das crianças e adolescentes do país moram nas regiões que veiculam a programação mais cedo do que o recomendado, em razão dos diferentes fusos.
Levantamento realizado pela Andi (Agência de Notícias dos Direitos da Infância) a pedido da Folha aponta que há 26,64 milhões de pessoas de zero a 17 anos nesses locais (incluindo o Nordeste). Em todo o país, são 60,96 milhões nessa faixa (dados do Censo 2000 do IBGE).
A Andi defende que a portaria protege crianças e adolescente de conteúdos inadequados na TV, como excesso de sexo e violência, e que torna iguais os direitos da infância nos diferentes Estados.
A regra do fuso é o principal motivo para que as redes se oponham à portaria e à obrigatoriedade de cumprir os horários determinados pela classificação do governo.
A Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV) afirmou à Folha que "há grandes dificuldades técnicas em realizar transmissões diferenciadas em razão de fuso horário". Segundo a entidade, "as maiores prejudicadas seriam, sem dúvida, as afiliadas locais".
Além disso, defende que essa norma fere a "liberdade de expressão" e que os pais têm "o direito e a obrigação de zelar pelo que seus filhos assistem".

Há meios de fazer
Nem as redes nem a Abert responderam o que teria de ser feito para que cada região tivesse um diferente horário de programação. Executivos de duas redes, que pediram para não ser identificados, explicaram à Folha o mecanismo.
As TVs retransmissoras dos locais afetados teriam de gravar a programação por meio de um software (programa de computador) e exibi-la com atraso em relação ao horário de Brasília. Assim, o Acre, por exemplo, mostraria tudo com duas horas de atraso (três no horário de verão), e a novela classificada para as 21h seria então exibida nesse horário.
Um ajuste teria de ser feito com os telejornais, para que fossem ao vivo em todo o país. O "Jornal Nacional" continuaria no ar às 18h no Acre (17h no horário de verão), como é atualmente. Para isso, as retransmissoras teriam de alterar a ordem de alguns programas. Os comerciais do telejornal não poderão trazer conteúdo inadequado a esse horário. Outra solução é exibir a propaganda do jornal em outro programa, veiculado mais tarde. Para isso, seria preciso negociar antes com anunciantes.
A Folha apurou que algumas TVs regionais vêem com bons olhos a medida, especialmente porque há a possibilidade de criar novos espaços à programação regional e à conseqüente venda local de anúncios.
Já as redes esperam que a regra seja derrubada na Justiça. O Supremo Tribunal Federal ainda analisará ação movida pela OAB contra a obrigatoriedade de exibir programas em horários fixados pelo governo.


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