São Paulo, domingo, 28 de março de 2004

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Zuza Homem de Mello divide-se entre programar shows para o hotel Fasano e para a periferia de SP

O ceu é o limite

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL

Há algo em comum entre o hotel Fasano, um dos mais sofisticados de São Paulo, e os CEUs (Centros Educacionais Unificados), os escolões instalados em bairros da periferia paulistana pela prefeitura do PT. O nome da coincidência é Zuza Homem de Mello, 70, diretor artístico de shows que acontecem nessas duas extremidades da pirâmide social da cidade.
O produtor e musicólogo foi escolhido pelo empresário Rogério Fasano, 41, para orientar a programação de shows do Baretto, seleto bar de 50 lugares que fica dentro do hotel Fasano, na região dos Jardins.
O Baretto abrigou, no final do ano passado, show beneficente de Caetano Veloso, cujos ingressos custavam R$ 500. O primeiro programado sob a batuta de Zuza foi o carioca Eduardo Dussek, 44, que cumpriu temporada nas duas últimas semanas, a preços bem menos salgados: R$ 70.
"O cálculo é simples, é o cachê do artista dividido por 50 lugares", explica Fasano. Ele diz que gostaria de manter o hábito de trazer artistas que andam enclausurados no gigantismo do showbiz. "O Baretto está aberto a quem quiser cantar aqui, desde que aceite se adequar às condições de espaço e cachê."
Meio invisível hoje na mídia, Dussek é artista que cumpre atualmente agenda tão diversificada -e aparentemente contraditória- quanto a de Zuza.
É que o "showman" que deu pinta no Baretto é, de certo modo, o mesmo personagem que ele vem adaptando para shows fechados que faz em convenções de empresas, bancos e outras instituições. "O meu é o melhor do mercado, sou considerado top nessa área", brinca, sério.
"Transformei-o num show em que o personagem principal fosse eu mesmo, quase um vigarista se colocando como um cara elegante e sofisticado", explica, exibindo espírito autocrítico que estende ao próprio show (leia ao lado).
Dussek diz que seu divórcio com a grande mídia é proposital. "Quando começaram a achar que eu era porra-louca e que minha obra estava se enfraquecendo, tirei meu time de campo. Graças a Deus continuei tendo mercado. Se há uma coisa de que tenho certeza é que tenho talento".
"Sou um caso raro, nunca parei de trabalhar. Sou empresário de mim mesmo, tenho minha produtora há 14 anos", prova, dizendo detestar a imagem do artista que se considera injustiçado. "Se as pessoas não estão lhe entendendo, quem não está sabendo se explicar é você", crava.
Mesmo sabendo que o formato do Baretto é restritivo, Zuza acaba por justificá-lo como um projeto que vai contra a corrente do show business atual. Combate o atual panorama de shows faraônicos: "As casas precisam vender 4.000 ingressos e ficam em pânico quando conseguiram vender só 2.000. É uma loucura".
"Não agüento show de rodeio, você não vê mais um Edu Lobo cantando. Edu, aliás, é um dos que quero trazer para o Baretto", planeja. Zuza negocia também uma temporada solo de Paula Toller, num espetáculo a ser montado especialmente por ele e pela líder do Kid Abelha.
Sabe que os shows que prepara para rodarem os CEUs de abril a dezembro deste ano também são restritivos, mas dessa vez para o público de classe média que circula pela região central da cidade.
Selecionou 30 artistas pouco conhecidos ("mas de grande talento"), como Tião Carvalho, Moisés Santana e Sudaka. Eles passarão em rodízio por dez CEUs, em shows gratuitos para as comunidades locais. "Gosto desse tipo de alternância. Sempre fui fã de jazz e de música caipira", sintetiza.


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