DA REPORTAGEM LOCAL

Todo caso de amor que se preze envolve algum grau de dependência, a defesa inflamada do objeto da afeição e uma certa surdez para críticas (coerentes que sejam). Não poderia deixar de ser assim com "Paixão por Cigarro", documentário que o GNT mostra hoje.
Bombardeados com estatísticas preocupantes (metade dos fumantes morre de efeitos do hábito; a expectativa de vida de quem fuma cai dez anos), entusiastas do tabaco de todas as latitudes reagem com humor, desprezo ou despojamento hedonista. "Vamos todos morrer mesmo. Por que, então, não aproveitar a vida enquanto podemos?", indaga um deles.
Um pouco antes, outro fumante lista ases da literatura que se dividiam entre a pena e o cigarro -entre eles Samuel Beckett e Oscar Wilde- para embasar sua tese: o que teria sido da literatura ocidental sem o tabaco? Pouco depois, a respeito da blitz antitabagista, o sujeito dispara: "São todos uns puritanos.
Não podem ver alguém tendo prazer com um cigarro na mão! Pergunto: haveria vida boêmia sem cigarro?".
Da "bancada" antitabaco, pinça uma representação diversa: o cientista que desenvolveu o adesivo de nicotina, o homem que denunciou a propaganda enganosa ("nicotina não vicia") da sua ex-empregadora e um médico por cujo bisturi já passaram 4.000 pulmões acinzentados. (LUCAS NEVES)