São Paulo, quinta-feira, 28 de julho de 2005

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Peça expõe a cultura sucateada

DA REPORTAGEM LOCAL

Fauzi Arap, 67, é diretor dos mais discretos na órbita do teatro brasileiro. "A vida tem várias caras", diz ele, usando sua boina indefectível.
Conjuga a também discreta face de dramaturgo com a do encenador em "Chega de História", peça de 1990, para dois atores, que sofreu poucos retoques na nova montagem com Tonia Carrero e Nilton Bicudo, em temporada a partir de amanhã no teatro Promon, em São Paulo.
O texto, uma comédia, nasceu sob os escombros do governo Collor (1990-1992), que ainda não tinha caído de fato, mas já demolira a cultura de cabo a rabo, nas palavras de Arap.
Ainda que hoje o cenário não seja dos mais alentadores. "Não existe mais cultura, só comércio", diz o diretor.
Sintomático. Em "Chega de História", há um grêmio cultural por fechar. Será demolido. Especulação imobiliária ou que tais.
O diretor do espaço, Eurico (Bicudo), trabalha ali há 15 anos, engrenagem na máquina burocrática. A ação se passa na derradeira noite de atividades, quando a professora Filomena Terezinha, mais conhecida por Dona Filó (Carrero), "uma anônima heroína da educação", é convidada a falar sobre "o papel dos imigrantes na construção e desenvolvimento dos valores culturais de nosso país", como introduz o personagem Eurico.

Críticas
Mal começa a peça, e Dona Filó diz a que veio: traz a discórdia, a indignação com os dias de inflação, dívida com FMI, o seu cotidiano de aposentada sem dinheiro etc.
Perplexo, Eurico a interrompe a todo instante, lembrando que o assunto é outro e não se pode falar mal do governo naquele auditório público, "pero no mucho".
A comédia transcorre assim, Dona Filó falando pelos cotovelos, Eurico tentando contê-la e, ao mesmo tempo, expondo sua condição de funcionário público tão explorado quanto, pai de quatro filhos.
"É estranha a camisa-de-força na qual a cultura está metida. Na verdade, isso sempre existiu, de uma forma ou de outra, mas tenho a impressão de que hoje em dia ocorre um paroxismo. A solução talvez seja se embriagar e fazer arte do jeito que dá", afirma Arap.
Cita exemplos de grupos como o Oficina, dirigido por José Celso Martinez Corrêa, no qual atuou nos anos 60, e o Cemitério de Automóveis, por Mário Bortolotto, ator que já dirigiu em "Santidade", de José Vicente, e "Kerouac", de Maurício Arruda Mendonça.
Arap dirigiu Tonia Carrero pela primeira vez na peça "Navalha na Carne" (1967), de Plínio Marcos. É o quarto projeto que os une. O diretor sabe que, a despeito da entrelinha ideológica de "Chega de História", o espetáculo é devidamente apropriado pela personalidade da veterana atriz, como se viu em pré-estréias pelo interior paulista. Soma pelo menos uma dúzia de textos para teatro, entre eles "Pano de Boca" (1975), o primeiro. (VS)


Chega de História
Onde:
Espaço Promon (av. Presidente Juscelino Kubitschek, 1.830, Itaim Bibi, tel. 0/xx/11/3847-4111)
Quando: estréia amanhã, às 21h30; sex., às 21h30; sáb., às 21h; e dom., às 19h
Quanto: R$ 40 a R$ 50 (sáb.)


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