São Paulo, domingo, 28 de agosto de 2005

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"CRIME E PAIXÃO"

Aldrich faz da crise a força de seu filme

PAULO SANTOS LIMA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

A crise é uma questão em boa parte do cinema de Robert Aldrich. A da mitologia do western, que está em "Vera Cruz" (54), e a do noir glamourizado pelo cinema dos anos 40, em "A Morte num Beijo" (55), são exemplos. Outra é a do policial durão e ético, cuja fibra rígida parece derreter em "Crime e Paixão" (75).
Em "Crime e Paixão", o "tough guy" é o policial Phil (Burt Reynolds), que no final das contas não é lá muito durão. Traumatizado pelo chifre que tomou da mulher, evita assumir casamento com Nicole (Catherine Deneuve), uma classuda prostituta de luxo cujo trabalho, claro, vai irritando os brios do tira apaixonado. A imagem clássica do policial inabalável está em crise, cheia de desgastes nesses anos 70.
Década que também aponta um olhar mais cínico sobre o mundo. No filme, investiga-se a morte de uma atriz pornô. Aparentemente, a pequena se suicidou, o que seria conveniente para seus clientes, todos figurões da alta casta política dos Estados Unidos. Mas o pai da garota, neurótico veterano da Guerra da Coréia, ultrapassa a polícia para tentar desvendar a fatalidade. A câmera de Aldrich, que não é das mais elegantes em seus movimentos, filma esta Sodoma e Gomorra atenta ao prosaico, inclusive a baixaria que freqüenta o departamento de polícia, antro de criminosos e policiais pornográficos e sádicos. Um país na UTI.
Também em estado grave está aquele gênero policial que consertava as coisas no epílogo da trama. Se já em "A Morte num Beijo", por exemplo, havia uma visão distópica sobre o ser humano em seu planeta (inclusive com um inédito cinema que privilegiava a presença de corpos na tela), em "Crime e Paixão" o mundo não é melhor. Pior até, naquele instante pós-"Operação França" (71), quando, pelo menos para aquele Robert Aldrich em crise, não havia muito a se mostrar de inovação na imagem, a não ser importações e misturas inusitadas, como a de referências a "Moby Dick" e "Um Homem, Uma Mulher" e pôr Catherine Deneuve nos braços do galã Reynolds.


Crime e Paixão
  
Direção: Robert Aldrich
Lançamento: Paramount (R$ 38, em média)



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