São Paulo, Sábado, 28 de Agosto de 1999
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ENTREVISTA
"Estou atingindo a maturidade"

LEDUSHA SPINARDI
Colunista da Folha


Soltando palavras como pipas, um humor impecável -que vai do sublime ao mais humano deboche- permeia o 14º livro de Mario Prata.
"Minhas Mulheres e Meus Homens" é composto por verbetes em que o cronista, escritor, jornalista e roteirista de TV e teatro narra situações vividas com amigos, parentes, namoradas (alguns famosos e muitos queridos anônimos) com o sorriso e o lirismo dos "clowns de Shakespeare".

Folha - Como surgiu "Minhas Mulheres e Meus Homens"?
Mario Prata -
Esse livro, analisando depois de pronto, é a somatória de duas características do meu trabalho: uma é que todos os meus livros, em termos formais, são de crônicas, que é onde eu me acho mais à vontade.
Minha formação é de cronista. Sempre quis escrever crônica em jornal. Hoje escrevo e vivo disso. Outra característica é que eu gosto muito de descobrir antes a forma do trabalho.

Folha - Como você pensou nesse formato?
Prata -
Um dia eu estava olhando para minha agenda de telefones no computador enquanto esperava uma ligação e comecei a reparar em um nome e lembrei de uma história daquela pessoa. Olhei outro nome e lembrei outras histórias. Aí pensei: vou escrever um livro contando casos dessas pessoas, foi a idéia inicial.
E comecei a escrever essas histórias, algumas passadas nos anos 70, nos 60, 30, 40, e, conforme fui escrevendo, fui percebendo várias coisas que não estavam no projeto inicial. Primeiro, que estava fazendo uma autobiografia a partir da biografia dos outros.
Segundo, que, se fosse lido na ordem cronológica, obtinha-se um retrato muito preciso da geração de todo o pessoal que está nesse livro, não só da minha.

Folha - O fato de o livro permitir três formas de leitura, ou seja, por ordem alfabética, ordem cronológica e a esmo, me lembrou "Rayuela", aquele roteiro sugerido pelo Cortázar.
Prata -
O Cortázar foi um dos caras que mais me influenciou, um ídolo. Li o Cortázar em 65. Ele trabalha com o tempo, como eu trabalho com a forma -sem querer me comparar a ele.

Folha - Há um preconceito, uma idéia falsa de que tudo que é escrito com técnica é rígido, racional e não atinge o leitor. E o que é fruto da inspiração é verdadeiro, você não acha?
Prata -
Como é que um cara vai operar uma hérnia sem técnica? E, da mesma forma, ele tem de operar a hérnia na hora necessária. Como o escritor. Ele tem de fazer a crônica. Tem de escrever o livro. Então escrever é uma coisa profissional, tem técnica sim, e a técnica pode ser ensinada.

Folha - Há outro livro vindo?
Prata -
Há 15 dias eu estava almoçando no Ritz e entrou uma loira linda, uma garota de uns 19, 20 anos, talvez menos. Sentou do outro lado, sozinha, e tirou um livro da bolsa para ler.
Era um livro de capa amarela, que achei ser o meu livro "Mas Será o Benedito?". Fui ao banheiro só para dar uma espiada e ver se era mesmo. Era um romancinho desses babacas, de adolescente.
Pensei: "Se essa menina está lendo esse tipo de livro, jamais leria um livro meu, a não ser que eu escrevesse um dirigido para ela, para adolescentes. Poderia fazer um livro pra ela e, no mesmo livro, escrever um livro para quem gosta de policial. Aí aproveitava também para fazer um livro, dentro do livro, de auto-ajuda. Aí um livro esotérico, um para criança, um para professor da USP...".
Fui viajando nisso, e vão ser 15 livros, cada um para um público. Quinze livros dentro de um só. Quinze histórias. Tudo com humor, evidentemente. Mas aquela menininha lá do Ritz vai ler achando que é aquilo mesmo: "O sol penetrava pela janela...".
Ela vai achar legal, e quem gosta de policial vai ler aquilo com humor. Será o meu 15º livro, com 15 histórias.

Folha - E uma autobiografia, mesmo, está nos seus planos?
Prata -
Não, acho que seria pretensão. Com 53 anos é cedo, estou atingindo a maturidade agora. Percebi que a maturidade é o seguinte: é quando você descobre, definitivamente, que é imaturo.
Aí vem a envelhecência, o período entre a maturidade e a velhice.


Livro: Minhas Mulheres e Meus Homens Autor: Mario Prata Lançamento: Objetiva Quanto: R$ 24 (256 págs.)

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