São Paulo, sexta-feira, 28 de setembro de 2001

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O norte-americano Peter Bagge explica à Folha por que se tornou -sem querer- a "voz da geração grunge"

"Ódio" a nanquim

DIEGO ASSIS
DA REDAÇÃO

Um ano antes que os acordes de "Smells Like Teen Spirit" invadissem as FMs, em setembro de 1991, a revista "Ódio" (do inglês, "Hate") já exportava a rotina pacata, esfumaçada e ao mesmo tempo musicalmente agitada que serviria de palco para a explosão das bandas grunge de Seattle.
Aproveitando-se de suas próprias experiências, o quadrinista Peter Bagge criou o título pensando em Buddy Bradley. O personagem já havia aparecido nas páginas da revista "Neat Stuff", editada pela Fantagraphics, como o filho do meio de uma família suburbana de Nova Jersey. Mas foi sua mudança para Seattle (nos anos 80, Bagge fez o mesmo), habitat natural da galeria de freaks, bêbados e garotas histéricas que povoam as histórias de "Ódio", que transformou a revista em sucesso de vendas.
"Eu tive experiências assim no passado. Felizmente, para mim, um passado bem distante", afirma Bagge, que hoje, aos 43 anos, é casado, tem uma filha na pré-adolescência e voltou a viver num bairro calmo de Nova Jersey.

Folha - Quem é o Buddy?
Peter Bagge -
Ele é basicamente um cara esperto, decente, mas também muito cínico e com uma pose de mau. Eu diria que ele próprio é o seu pior inimigo.

Folha - Você morava em Seattle, quando começou a escrever "Ódio". Como foi a recepção dos adolescentes ao título?
Bagge -
No início, estava apenas escrevendo sobre meu próprio passado (eu já tinha 30 anos) e esperava que os jovens de 20 e poucos anos se identificassem com ele. Foi baseado em Seattle só porque eu morava lá. E aconteceu de, alguns anos depois, a cidade ganhar fama de a capital "grunge", "largadona" do universo.

Folha - Nirvana, Screaming Trees, Love Battery, Tad, Mudhoney...
Bagge -
Eu não era um grande fã da música deles. Tinha presenciado um fenômeno similar 10, 15 anos atrás quando morava em Nova York e a cena punk/new wave começou a decolar. Então, foi como um déjà vu ver tudo acontecer de novo em Seattle.

Folha - Você fez capas de disco para artistas da Sub Pop (Tad) e de outros selos independentes (Girl Trouble, Auction Suits etc.).
Bagge -
Pois é, mas, em geral, as bandas não estavam nem aí para quem desenhava suas capas. O único contato que tinha com elas era através do Bruce Pavitt, da Sub Pop, que me chamou para desenhar capas e pôsteres.

Folha - Que influência artistas como Robert Crumb e os irmãos Gilbert e Jaime Hernandez (de "Love & Rockets") têm sobre as suas HQs?
Bagge -
Nos anos 80, fui o editor de uma revista de antologias iniciada pelo Crumb chamada "Weirdo". Ele é o meu artista favorito e foi ótimo trabalhar com (ou para) ele. Dos Hernandez, só trabalhei com o Gilbert num título chamado "Yeah!" [Bagge se inspirou nas Spice Girls para escrever o argumento, alegando que seria algo que "sua filha ia gostar". Ele insiste em dizer o mesmo sobre a cantora Britney Spears" publicado pela DC Comics. Um fracasso que só durou nove edições. Mesmo assim, sempre admirei o trabalho deles desde que li o primeiro "Love & Rockets".

Folha - Você ainda sente prazer em fazer quadrinhos?
Bagge -
Bem, é a única coisa que eu posso fazer para pagar as minhas contas. Isso às vezes é frustrante, sinto-me empacado ou preso aos quadrinhos. Mas ainda gosto de fazê-los. É melhor do que ficar preso em um emprego chato de escritório.


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