São Paulo, domingo, 28 de outubro de 2007

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Mônica Bergamo

@ - bergamo@folhasp.com.br

O trabalho, as histórias e algumas extravagâncias dos estilistas Lino Villaventura, Gloria Coelho, Ronaldo Fraga, Walter Rodrigues e Alexandre Herchcovitch viram livros biográficos da editora Cosac Naify


À esquerda, a mãe de Alexandre Herchcovitch, Regina; o estilista com seu irmão, Artur


Biblioteca fashion

"O taxista coçou a cabeça. Era tarde. Ainda precisava enfrentar o complicado trânsito paulistano para levar a galinha à Fundação Bienal." A galinha em questão era pedido do estilista Ronaldo Fraga para seu desfile no Morumbi Fashion, em 1996. "O motorista de uma amiga foi até uma granja e colocou o celular no bico da galinha para que ela ouvisse o canto. Ela disse: "Essa está ótima! Animadíssima! Pode trazer". A galinha foi para a Bienal e gravamos o canto para a trilha do desfile", conta Fraga.

 

A história está registrada na biografia do estilista, uma das cinco da série "Coleção Moda Brasileira", que a Cosac Naify lança amanhã em SP. Além de Fraga, Walter Rodrigues, Lino Villaventura, Gloria Coelho e Alexandre Herchcovitch foram biografados. Coordenados por João Rodolfo Queiroz e Reinaldo Botelho, os livros trazem compilação de fotos e histórias das coleções de cada um.
 

"Eu sou de uma época em que não tinha bibliografia de moda no Brasil", diz Fraga. Agora, em seu livro, o mineiro de 41 anos é descrito pela autora Carol Garcia como alguém que "brotou de uma sofisticação caipira". "Ronaldo faz pensar", diz, relembrando coleções inspiradas em Zuzu Angel e Guimarães Rosa, além de desfiles mais performáticos.
 

Em um deles, em 1998, "as modelos entram na passarela comendo sofisticados pratos da culinária francesa, mas terminam misturando feijoada e macarrão". Fraga contratou uma banqueteira, encomendou canapés de foie gras, pato assado e macarrão. "A gente comeu tudo o que sobrou depois", diz Fraga. Em 2002, quis conhecer o presídio José Maria Alckmin, em MG. "Na fila, tinha aquelas mulheres com roupa de festa, meninas com vestido de debutante para mostrar aos pais. Decidi levar uma bordadeira para dar aula aos presos. Um deles bordava todo dia a mesma frase: "Washington, eu te amo". Perguntei quem era e ele disse: "É meu filho. Tem cinco anos. E não passa um dia em que eu não pense em dizer pra ele "Washington, eu te amo"." Os bordados foram usados em uma das coleções do estilista.
 

"Artesão de luxo", como classifica a autora de sua biografia, Eva Joory, o estilista Walter Rodrigues, segundo ela, "faz uma moda única". "Seu ateliê é sempre uma festa. Muito trabalho, mas uma parada obrigatória para o cafezinho é lei", escreve. Ele se diz outro: "Sou um chato! Uma vez, a Mariana Weickert perdeu a sandália na passarela. Fiquei cho-ca-do! Foi horrível, horrível, horrível! E provavelmente ninguém ligou". Walter, que pediu a bordadeiras do Piauí para que fizessem o vestido amarelo -com 1.200 camélias de renda- que a primeira-dama Marisa usou na posse de Lula, este ano, diz que não gosta "de ouvir que sou o estilista da primeira-dama. O que me agrada nisso é o atendimento indoor, entrar no contexto da cliente".
 

Já Gloria Coelho é descrita como mulher "forte, pulso firme, coração macio", no prefácio de Regina Guerreiro. "Em 1978, ainda meio riponga e toda louquinha, conheceu Marie Rucki (diretora do Studio Berçot de Paris) e se apaixonou por ela", diz. "Como acredita nos astros, o horário de seus desfiles é sempre marcado por eles: "Tem que ser ao meio-dia, tem que ser às 15 horas..."." E, de acordo com o autor Carlos Mauro, a estilista "só contrata pessoas após analisar seu mapa astral e marca seus compromissos segundo aspectos das lunações".
 

"Quem veste suas roupas carrega em si pompa e personalidade", diz o biógrafo. Ele conta que Gloria, em 1981, conheceu Reinaldo Lourenço, na época, seu assistente. Dois anos depois, moravam juntos e, em 1983, nasceu Pedro Lourenço. Todos estilistas. "Sua empresa é gerida em família, movida pelo seu temperamento e sua personalidade."
 

Ao contrário dos desfiles clean de Gloria, Lino Villaventura, 56, diz que é "cheio de surpresas". "Em 1998, pintei os dentes das modelos e botei todos fumando cachimbo. A produtora teve uma crise, tossia sem parar", conta. Em sua biografia, Jackson Araujo descreve a cena como "uma trupe de dândis consumidores de ópio, haxixe e absinto".
 

"Filho de comerciante, dono de fábrica de guaraná, exportador de peles exóticas, Lino traz impresso no código genético a inquietude", diz seu biógrafo. Em 2005, por exemplo, encomendou seis najas da Tailândia. "Forrei com tafetá de seda e bordei com 14 mil cristais Swarovski. O valor é absurdo. Não dá pra vender. Guardo como acervo", diz Lino.
 

A biografia de Herchcovitch foi escrita por Charles Cosac. A mãe do estilista, Regina, tinha uma confecção de lingerie em casa no final dos anos 80.
 

"Não é verdade que Alexandre tenha começado por baixo", escreve Cosac. "Ele pode não pertencer às altas castas do judaísmo paulista, mas teve acesso ao ensino médio e superior pagos, viajou para outros países ainda jovem, etc. Fatos comuns, no Brasil, às classes mais privilegiadas."


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