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CRÍTICA
POESIA
Versos de Keats têm tradução cuidadosa
Reedição mostra como o vínculo entre a ética e a estética marca a produção poética do autor romântico inglês
NOEMI JAFFE
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
""A beleza é a verdade, a
verdade a beleza" -é tudo/ O
que sabeis na terra, e tudo o
que deveis saber." Talvez na
voz de outro poeta, estes versos tão assertivos e solenes
soassem como presunção.
Não na voz de Keats (1795-1821), entretanto, para quem
este era o fundamento da vida (que durou apenas 24
anos) e que conseguiu atingir
esta coincidência -entre
Verdade e Beleza- em sua
poesia.
Na aurora do romantismo
inglês, "Verdade" e "Beleza", em maiúsculas e no singular, ainda faziam sentido.
O vínculo idealista entre a
ética (aqui representada pela
"Verdade") e a estética (a
"Beleza") tinha significação
fundamental tanto para a filosofia como para a poesia.
Hoje estas mesmas palavras são, ao contrário, utilizadas somente em minúsculas e no plural. Temos verdades e belezas.
No livro "Ode sobre a Melancolia e Outros Poemas",
da editora Hedra, Péricles
Eugênio da Silva Ramos faz
um estabelecimento de texto
cuidadoso, em que percorre
alguns dos caminhos que levaram o poeta a este lugar
desconhecido, onde está reunido "tudo o que devemos
saber na terra".
O crítico e tradutor (e também poeta da geração de 45),
mostra, no prefácio, como o
próprio Keats escreveu sobre
a equivalência entre "Verdade" e "Beleza", defendendo
ainda outros valores de grandezas semelhantes, como a
intensidade, a capacidade de
manter-se em permanente
estado de incerteza e o esvaziamento da personalidade.
ALTERIDADE
Este último, para Keats, é
um traço essencial para que,
num poema, ressoe o Belo intacto, não corrompido pelos
caprichos do Eu. "O poeta é o
mais impoético de tudo o que
existe, porque não tem identidade; continuamente adentra e enche outro corpo."
Tudo isso muito antes de
surgir, por exemplo, um poeta como Fernando Pessoa,
que fez dessa alteridade, ou
da heteronomia, uma prática
de vida e da poesia.
A "Ode sobre uma Urna
Grega", a "Ode a um Rouxinol" e a "Ode sobre a Melancolia" são apenas três dentre
vários outros poemas em que
se leem a melancolia aliada à
alegria, o passado ao presente, a morte à vida, e todas no
limite mais belo da linguagem poética.
Mas, embora tanto o prefácio como as traduções desta
reedição (originalmente publicada pela Art Editora, em
1985) tenham caráter referencial para os estudiosos e
interessados na poesia de
Keats, há traduções melhores para vários de seus poemas, como, por exemplo, as
de Augusto de Campos para
o "Endimião" ou para a "Ode
sobre uma Urna Grega" (Unicamp, 2009).
Enquanto Silva Ramos elimina as rimas e o metro fixo,
mantendo somente o andamento, Augusto de Campos
escolhe um metro e mantém
as rimas, além de alcançar
efeito poético equivalente ao
do idioma inglês, em língua
portuguesa.
Como traço de fidelidade
ao original, a tradução de Silva Ramos tem muitos méritos. Mas a tradução poética,
já se sabe, não é somente
uma questão de fidelidade ao
conteúdo.
ODE SOBRE A MELANCOLIA E OUTROS POEMAS
AUTOR John Keats
TRADUÇÃO Péricles Eugênio da
Silva Ramos
EDITORA Hedra
QUANTO R$ 15 (154 págs.)
AVALIAÇÃO bom
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