São Paulo, sábado, 29 de outubro de 2005

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LIVROS

BIOGRAFIA

Livro de Tom Cardoso apresenta a trajetória do editor e colunista

Jornalista Tarso de Castro ganha revisão passional

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Tarso de Castro (1941-1991) é um tempo que acabou. Não por culpa dele ou de alguém em particular, mas porque o tal curso da história parece ter fechado as portas para jornalistas combativos (no sentido de raivosos e parciais), polêmicos (de fato, não os caricatos), idiossincráticos (ele escrevia o que vinha na telha, normalmente umedecida pelo álcool) e apaixonados (atacava e ridicularizava os inimigos da hora, que podiam ser os amigos de ontem ou de amanhã).
Como tudo que o envolvia, a biografia "Tarso de Castro - 75 kg de Músculos e Fúria", que acaba de chegar às livrarias, é passional. Seu autor, o jornalista Tom Cardoso, 32, considera esse adjetivo forte. Prefere dizer que procurou fazer justiça ao personagem, um dos homens de imprensa mais polêmicos do país entre os anos 60 e 80.
"Apesar de ser um porra-louca, um homem de bar, Tarso era um profissional responsável, um fazedor de muitas coisas. Infelizmente, pouco se fala dele hoje", diz Cardoso.
Gaúcho de Passo Fundo, filho de um dono de jornal e cacique trabalhista local, Tarso herdou do pai as paixões por jornalismo e Leonel Brizola -paixões que se fundiram mais de uma vez.
Adolescente, já incomodava com seu estilo sarcástico-abrasivo em "O Nacional", jornal do pai. Passo Fundo ficou pequena, foi para Porto Alegre, para a "Última Hora" gaúcha. O Rio Grande ficou pequeno, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde conquistou uma coluna na "Última Hora" em que ironizava ou atacava mesmo os militares. Em 1969, ajudou a criar o mais importante dos jornais de esquerda surgidos durante a ditadura.
"Quis fazer justiça, especialmente, quanto à criação do "Pasquim". Tarso é quem foi convidado para substituir Sérgio Porto [editor de "A Carapuça", que se transformou em "O Pasquim'], ele foi o grande catalisador. Hoje, até gente que teve participação pequena é mais associada ao jornal do que ele", diz Cardoso.
Dos dois mais notórios desafetos de Tarso dessa época, o autor conseguiu entrevistar Ziraldo, mas não Millôr Fernandes, que não respondeu a seus pedidos. Millôr acaba saindo do livro como uma espécie de vilão, em especial por ter sido o único prócer do "Pasquim" a não ser preso pelos militares.
A carreira de Tarso teve outros grandes momentos na Folha, por onde passou três vezes: entre 1975 e 77, quando foi editor da Ilustrada e criou o "Folhetim", suplemento dominical lançado em 23 de janeiro de 1977 e que foi revolucionário na época, com grandes entrevistas, perfis, reportagens e colunistas de peso, tratando de política, cultura e comportamento; entre 1982 e 85, quando assinou uma muito lida coluna na Ilustrada; e na "Folha da Tarde", entre 1988 e 91.
Conquistou a admiração do dono do jornal, Octavio Frias de Oliveira, e de Claudio Abramo, diretor de Redação, mas, durante sua segunda passagem, bateu de frente com as mudanças que vinham sendo implantadas. Perdeu sua coluna por "divergências com as concepções jornalísticas em prática na Folha", conforme nota do jornal reproduzida no livro. Cardoso cita entreveros que culminaram com sua saída.
O autor veste, no livro, a camisa de seu (anti-)herói. Isso não significa que tenha omitido características fundamentais de Tarso. Estão lá o irascível, o incontrolável, o inconciliável, o intransigente, o inveterado alcoólatra que não admitia se tratar e morreu de cirrose hepática aos 49 anos ("Prefiro viver pela metade por uma garrafa de uísque inteira a viver a vida inteira bebendo pela metade.").
Também estão o bem-sucedido sedutor, que conquistou muitas e até inalcançáveis mulheres, como a atriz norte-americana Candice Bergen, e o dono de amizades fidelíssimas com Chico Buarque, Caetano Veloso, Glauber Rocha e outros.
"Eu gostaria de ter sido jornalista naquela época, quando havia uma cumplicidade entre artistas e jornalistas. Tarso ia a campo, conseguia muitas pautas e entrevistas no bar", diz Cardoso.
Sua admiração pelo personagem permite que as versões de Tarso sobre os fatos sobressaiam, mesmo que às vezes haja um tanto de folclore nessas versões. Mas também confere paixão ao relato sobre um homem que sempre foi passional.


Tarso de Castro - 75 kg de Músculos e Fúria
Autor:
Tom Cardoso
Editora: Planeta
Quanto: R$ 37,50 (280 págs.)


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