|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Análise
Vaia reafirma força do festival quarentão
JOSÉ GERALDO COUTO
CRÍTICO DA FOLHA, EM BRASÍLIA
Viva a vaia. Ela mostra
que o Festival de Brasília é um quarentão "enxuto e tesudo", para repetir as
palavras que o cineasta baiano
Edgar Navarro usou para qualificar o colega Carlos Reichenbach durante sua intervenção
no debate do filme deste último, "Falsa Loura".
Apesar dos seis Candangos
para "Cleópatra", a decisão do
júri não deve ter sido fácil. Estavam em competição seis longas mais do que dignos de reconhecimento, cada um deles
apostando num modo diferente de fazer cinema. Em circunstâncias assim, escolher é uma
tarefa cruel.
O favorito do público, "Chega
de Saudade", de Laís Bodanzky,
é um primor de competência e
delicadeza ao tratar de um tema espinhoso, sobretudo para
uma realizadora tão jovem: a libido na chamada terceira idade.
O modo como a diretora entrelaça os dramas e desejos de
uma dúzia de personagens nos
limites restritos de espaço e
tempo (uma noite num salão de
danças) justifica plenamente os
prêmios conquistados, de direção e roteiro.
Mas "Cleópatra" é cinema de
outro calibre. Uma viagem da
inteligência e da sensibilidade
por esse Mediterrâneo imaginário em que se cruzam as potências criativas da Europa, da
Ásia e da África.
Ao adotar um viés lírico, luso-brasileiro, para abordar o
mito de Cleópatra, Bressane
não abandonou a dimensão
histórico-épica da personagem,
mas como que a condensou no
erótico, no sensorial.
Um exemplo ao acaso: enquanto a câmera se fecha num
detalhe da túnica grená de César, ouvimos na trilha sonora o
mar, cavalos, retinir de espadas: toda a campanha romana
no Egito numa admirável síntese audiovisual.
Nem todos embarcaram nessa viagem, o que é uma pena.
Uma pena também que "Falsa
Loura" -talvez o Reichenbach
mais leve e inspirado dos últimos anos- tenha ficado na
sombra, bem como o amoroso e
radical "Anabazys".
Premiando "Meu Mundo em
Perigo", de José Eduardo Belmonte, a crítica optou, com
boas razões, por apostar num
cineasta ainda em evolução,
mas cheio de vitalidade. E Rosane Mulholland -que brilha
tanto em "Meu Mundo" quanto
em "Falsa Loura"- talvez tenha sido a grande injustiçada
da noite.
Texto Anterior: Brasília consagra cinema "crespo" de Julio Bressane Próximo Texto: Coleção reduz distância entre centro e periferia Índice
|