São Paulo, segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

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TRECHO

- "Tudo que é triste,
tudo que é bom,
tudo que é belo,
tudo que existe,
tudo que sonhas poder olhar;
todas as cousas
que inda não viste
- todas as cousas
estão no mar:

barcos fantasmas,
velhas galeras
jazem tristonhas
sobre as areias,
dormindo cheias
de ouro e de prata;
por suas salas
passeiam peixes
entre piratas,
- homens-fantasmas-
que, embebedados,
cantam cantigas
e bebem rum;

tristes escunas
de velas rotas,
mastros quebrados
só de acenar
para a lembrança
do último porto
- tristes escunas
de casco roto
só de chorar!..."

(e o marinheiro ouvia absorto)

"Tudo que é morto vive no mar!...

Crianças mortas
de olhos de pérola,
boquinha de âmbar,
como a sonhar,
arrumam búzios,
conchas, estrelas,
pedrinhas brancas
cor de luar.

Deusas formosas
de claros braços,
cabelos de algas,
ventre de espuma,
líquido olhar
- dançam frementes,
bulindo os seios,
gingando o ventre
para Netuno
se deleitar.
Vênus perfeitas
como a de Milo,
que não desejam
sair do mar...

trecho de "Marinheiro", de "Um Pouco Acima do Chão" (Ferreira Gullar, 1949)


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