São Paulo, quinta-feira, 30 de março de 2006

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Festival sul-africano exibe diversidade

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Até 1994, ano em que a África do Sul realizou suas primeiras eleições democráticas e multirraciais, um evento como o 7º Cape Town International Jazz Festival -que começa hoje à noite com um concerto gratuito, ao ar livre, no centro da Cidade do Cabo- seria difícil até de imaginar.
Cerca de 40 atrações vão se apresentar nos cinco palcos instalados no Centro de Convenções Internacionais, amanhã e sábado. Astros da música local, como a cantora Miriam Makeba e o arranjador Caiphus Semenya, destacam-se no elenco ao lado de jazzistas norte-americanos, como o trompetista Terence Blanchard e o baixista Charlie Haden, além do pianista cubano Chucho Valdés e do violonista espanhol Juan Carlos Romero.
"A música transcende as fronteiras e fala às pessoas de todas as raças e nacionalidades", disse, em entrevista à Folha, Rashid Lombard, diretor do evento. Segundo ele, o jazz desempenhou um importante papel no combate à política de apartheid, que segregou a população negra da África do Sul por oito décadas, até ser revogada pelo governo, em 1990.
A censura imposta por essa política racista não conseguiu impedir que alguns clubes de jazz se tornassem pontos de encontro dos militantes negros. "Durante o estado de emergência, no final dos anos 80, quando todas as reuniões políticas foram proibidas, as apresentações de jazz eram usadas para divulgar mensagens políticas", relembra Lombard.
Os mais puristas podem até criticar o festival de jazz da Cidade do Cabo por exibir atrações de outros gêneros musicais, como o blues, o soul e o hip hop, mas não por falta de apoio à música do continente. "50% dos nossos artistas são africanos; os outros são internacionais", calcula o diretor, explicitando seus critérios para escolher o elenco.
O motivo para esse ecletismo, segundo Lombard, é a própria platéia local.
"O público sul-africano, em especial o da Cidade do Cabo, gosta de dançar ao som desse tipo de música, além de ser receptivo a novos artistas."
Curiosamente, ao contrário do que ocorre em muitos festivais do gênero, a música brasileira está ausente. "Com toda a honestidade, eu não conheço a cena musical do Brasil. Uma vez até tentei fazer contato com a embaixada brasileira, mas não obtive resposta", justifica o produtor, reconhecendo que até hoje músicos brasileiros só participaram do evento como acompanhantes.
"O ministro Gilberto Gil foi convidado por nosso ministro da Cultura a visitar a África do Sul, em 2003. Chegamos a conversar sobre uma participação, ao lado do guitarrista sul-africano Jimmy Dludlu, que ele conheceu numa reunião, em Davos. Os preparativos foram feitos, mas após a invasão do Iraque o ministro teve que cancelar", lamenta o diretor do festival.


Carlos Calado é jornalista e crítico musical, autor de "O Jazz Como Espetáculo", entre outros livros


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