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Festival sul-africano exibe diversidade
CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Até 1994, ano em que a África do
Sul realizou suas primeiras eleições democráticas e multirraciais,
um evento como o 7º Cape Town
International Jazz Festival -que
começa hoje à noite com um concerto gratuito, ao ar livre, no centro da Cidade do Cabo- seria difícil até de imaginar.
Cerca de 40 atrações vão se
apresentar nos cinco palcos instalados no Centro de Convenções
Internacionais, amanhã e sábado.
Astros da música local, como a
cantora Miriam Makeba e o arranjador Caiphus Semenya, destacam-se no elenco ao lado de jazzistas norte-americanos, como o
trompetista Terence Blanchard e
o baixista Charlie Haden, além do
pianista cubano Chucho Valdés e
do violonista espanhol Juan Carlos Romero.
"A música transcende as fronteiras e fala às pessoas de todas as
raças e nacionalidades", disse, em
entrevista à Folha, Rashid Lombard, diretor do evento. Segundo
ele, o jazz desempenhou um importante papel no combate à política de apartheid, que segregou a
população negra da África do Sul
por oito décadas, até ser revogada
pelo governo, em 1990.
A censura imposta por essa política racista não conseguiu impedir que alguns clubes de jazz se
tornassem pontos de encontro
dos militantes negros. "Durante o
estado de emergência, no final
dos anos 80, quando todas as reuniões políticas foram proibidas, as
apresentações de jazz eram usadas para divulgar mensagens políticas", relembra Lombard.
Os mais puristas podem até criticar o festival de jazz da Cidade
do Cabo por exibir atrações de
outros gêneros musicais, como o
blues, o soul e o hip hop, mas não
por falta de apoio à música do
continente. "50% dos nossos artistas são africanos; os outros são
internacionais", calcula o diretor,
explicitando seus critérios para
escolher o elenco.
O motivo para esse ecletismo,
segundo Lombard, é a própria
platéia local.
"O público sul-africano, em especial o da Cidade do Cabo, gosta
de dançar ao som desse tipo de
música, além de ser receptivo a
novos artistas."
Curiosamente, ao contrário do
que ocorre em muitos festivais do
gênero, a música brasileira está
ausente. "Com toda a honestidade, eu não conheço a cena musical
do Brasil. Uma vez até tentei fazer
contato com a embaixada brasileira, mas não obtive resposta",
justifica o produtor, reconhecendo que até hoje músicos brasileiros só participaram do evento como acompanhantes.
"O ministro Gilberto Gil foi
convidado por nosso ministro da
Cultura a visitar a África do Sul,
em 2003. Chegamos a conversar
sobre uma participação, ao lado
do guitarrista sul-africano Jimmy
Dludlu, que ele conheceu numa
reunião, em Davos. Os preparativos foram feitos, mas após a invasão do Iraque o ministro teve que
cancelar", lamenta o diretor do
festival.
Carlos Calado é jornalista e crítico musical, autor de "O Jazz Como Espetáculo",
entre outros livros
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