São Paulo, sábado, 30 de abril de 2011

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Neuman sabota gênero histórico em livro

Escritor argentino inventa metáforas com fatos e explora fronteiras entre gêneros em "O Viajante do Século"

Premiado com o Alfaguara, autor foi definido como "um talento brilhante" por Roberto Bolaño

DANIEL BENEVIDES
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Convidado para a próxima Flip, o argentino Andrés Neuman, 34, trafega com naturalidade por todos os gêneros. Já publicou 16 livros, entre eles "O Viajante do Século", que sai no Brasil.
O romance recebeu o prêmio Alfaguara e foi bastante elogiado pela crítica. Tido por Roberto Bolaño como "um talento iluminado", Neuman vive em Granada, na Espanha, de onde conversou com a Folha por e-mail.

 


Folha - Como foi partir de textos breves para um romance de quase 500 páginas?
Andrés Neuman -
Foi como passar de paraquedista a piloto de jato! Gosto de me arriscar. Se já sei como escrever, não tem emoção.

"O Viajante do Século" se passa no século 19, mas tem muito de contemporâneo. Era essa a intenção?
Me atraía a ideia de um romance que fizesse um zapping espaço-temporal. O lugar em que transcorre o relato se move, e a memória do protagonista parece a nossa: corrediça, simultânea.
"O Viajante do Século" pode ser lido como uma sabotagem ao gênero histórico. Há muita pesquisa, mas é tudo fictício. Buscava uma metáfora, não uma reconstrução arqueológica.

O argumento do livro foi inspirado numa canção de Schubert. Alguma relação com o fato de seus país serem músicos?
Sim, ouvia essa canção com minha mãe. Infelizmente, ela morreu enquanto eu escrevia o livro. Por um tempo, achei que não tinha sentido escrever ficção quando a realidade havia tirado o personagem mais importante da minha vida. Depois, entendi que inventar histórias é uma maneira digna de defender-se da morte.

Você escreveu que "todas as mulheres são tradutoras". Como isso se aplica à sedutora Sophie?
Na história entre Hans e Sophie, há uma ideia de fundo: todo amor é um ato de tradução, de interpretação do outro, e toda tradução é um ato de amor, de se apaixonar por palavras do outro.

De que forma a dupla nacionalidade afeta seu trabalho?
Quando você é educado em dois lugares, sabe que se sentirá duplamente estrangeiro. As consequências são múltiplas. Talvez por isso me interesse pela fronteira entre os gêneros: poesia que é narrativa, romance que funciona como ensaio.

Como você consegue escrever tanto?
Escrever e ler fabrica tempo. Nos dá todas as vidas que nos faltam, as lembranças que não temos. Converte nossa mortalidade inevitável em algo estético.


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