São Paulo, sábado, 31 de agosto de 2002 |
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LIVRO/LANÇAMENTO De volta aos Commitments
CASSIANO ELEK MACHADO ENVIADO ESPECIAL A EDIMBURGO O teatro, no centro da capital escocesa, estava escuro. A platéia lotada. Os holofotes voltados para o palco. Lá, sentado em poltrona estofada, apenas com um maço de folhas na mão, o homem baixo, magrela e de óculos pigarreia. Depois de 15 anos, o criador de uma das bandas mais bem-sucedidas da história da literatura (e do cinema), os Commitments, se preparava para apresentar pela primeira vez um novo conjunto. Nada de música. O escritor irlandês Roddy Doyle, 43, subia ao principal tablado do Festival Internacional de Literatura de Edimburgo era para ler -apresentar um conto inédito. Jimmy Rabbitte, o personagem que organizara o grupo de soul music no romance de Doyle, transformado em filme em 1991 por Alan Parker, chegara aos 36. Estava mais maduro, desempregado e prestes a ver sua prole, Aretha, Marvin e Mahalia, ganhar um quarto integrante. Rabbitte, que também protagonizou os romances "The Snapper" e "O Furgão", com profissões diferentes, decide voltar, não sem contrariar-se, a tentar novamente o empresariado musical. A arma é a mesma: anúncio em um jornal local, no estilo "Você quer tocar em uma banda?". Mas eis que Roddy Doyle, que ganhou notoriedade internacional fazendo a crônica da Irlanda contemporânea, especialmente a das classes trabalhadoras (e desempregadas), apresenta uma Dublin totalmente diferente. Nos 45 minutos de leitura acelerada de "The Deportees" (Os Deportados), o escritor mostra que a Irlanda mudou, e radicalmente, nos últimos cinco anos. A composição da banda amealhada por Rabbitte ajuda a ilustrar: no vocal, um africano; direto de Moscou vem o baterista; uma morena norte-americana faz o backing vocal; pai e filho, ambos romenos, assumem trompete e o acordeão. O baterista psicótico de "Commitments", recém-saído da prisão, depois de roubar o carro do tio, é o segurança. Eis a banda: "The Deportees". Eis a nova Dublin. "De repente, entrou tanto dinheiro na Irlanda, que imantamos uma multidão de imigrantes", diz Doyle . E foi no primeiro jornaleco de uma comunidade de imigrantes, por diversão, que o autor de "Paddy Clarke, Ha Ha Ha" (com o qual ganhou o principal prêmio da literatura inglesa, o Booker Prize, em 1993) publicou essa história, dividida em 15 partes. O conto deve sair na refinada revista "The New Yorker" no próximo bimestre, mas ainda não está programado para o formato livro. Enquanto isso, o enérgico Doyle vem correndo, na sua casa, em Dublin, uma maratona literária. O ex-professor de geografia que estreou na ficção há 15 anos, com "The Commitments" (livro ainda inédito no Brasil, embora a Estação Liberdade, que publicou quatro títulos de Doyle aqui, estude a tradução), trabalha a maior parte do dia no seu sétimo romance: a sequência da trilogia aberta com "Uma Estrela Chamada Henry". Ele também vem dando o retoque final ao livro "Rory and Ita", que sai em outubro nos EUA, com as memórias de seus pais, finaliza duas peças teatrais e mais um livro infantil. No Brasil, Doyle aparece agora no próximo mês com um conto na coletânea "Falando com o Anjo" (Rocco), organizada pelo amigo Nick Hornby. Antes disso, o escritor conta à Folha um pouquinho mais sobre o retorno ao universo "The Commitments", na única entrevista que deu em Edimburgo. Leia trechos a seguir. Folha - Por que o sr. decidiu fazer
esta espécie de volta aos tempos
de "The Commitments"? Folha - O que há por trás das mudanças pelas quais passa Dublin
em sua nova história, uma cidade
bem mais multicultural do que nos
seus romances anteriores? Folha - Alguns escritores escoceses presentes aqui em Edimburgo
caracterizaram a nova ficção feita
no país como marcada por características em comum, como um ambiente dark. O sr. acha possível falar de modo geral sobre a literatura
irlandesa contemporânea? O jornalista Cassiano Elek Machado viajou a convite do British Council Texto Anterior: "Romeu & Julieta" e "Hamlet": Entre mortos e feridos, salva-se o Shakespeare popular Próximo Texto: "Eny e o Último Grande Bordel Brasileiro": Obra visita a Casa de Eny, cafetina de Bauru Índice |
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