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Crítica documentário

Varda cria memória do mundo em sua autobiografia poética

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

O filme biográfico, no modo ficcional ou documental, tem sido um gênero relativamente comum no cinema.

Já a autobiografia na forma de imagens só se tornou habitual depois que as câmeras digitais vieram liberar as memórias pessoais da reserva dos filmes domésticos.

Em "As Praias de Agnès", produção de 2008 que só agora chega ao circuito comercial, a diretora Agnès Varda propõe um autorretrato, um relato na primeira pessoa que comporta os riscos e qualidades da visão em espelhos.

O filme se abre com Varda, na época às vésperas de completar 80 anos, andando numa praia imitando caranguejos. Esse retroceder anuncia o recuo que a diretora vai percorrer, recuperando pelo caminho sua trajetória, o que envolve a aparição de amigos, colaboradores e familiares.

"Eu represento o papel de uma velhinha miúda e tagarela que conta sua vida. Contudo, eu me interesso, de fato, pelos outros, são eles que gosto de filmar. São os outros que me intrigam, me motivam, me questionam, me desconcertam, me apaixonam. Dessa vez, para falar de mim, pensei, talvez, que se abríssemos as pessoas, encontraríamos paisagens. E se me abrissem, encontraríamos praias", apresenta-se diretamente ao espectador.

Nesta opção explícita pelo relato subjetivo, em vez de um memorial que poderia ser tanto fiel como tedioso, logo percebemos que Varda escolhe contar sua história vivida como se fosse inventada.

Nela encontramos peripécias, sofrimentos e alegrias, identificamos uma sucessão de fatos históricos (o nazismo, a nouvelle vague, a contracultura, o feminismo) sem confundi-los com a "objetividade" dos documentários.

Há, no texto dito no presente e nas imagens oriundas do passado, uma recombinação de experiências, uma sobreposição do visto e do vivido que faz "As Praias de Agnès" deixar de ser apenas autobiografia para se transformar em memória do mundo, história, em suma.

A sobreposição ganha pleno sentido quando, ao final, a diretora apresenta uma instalação feita de tiras de um filme inacabado, restos que ela usou para construir uma casa no espaço de um museu, uma morada à qual ela deu o nome de "cinema".

AS PRAIAS DE AGNÈS
DIREÇÃO Agnès Varda
PRODUÇÃO França/2008
ONDE Cinesesc
CLASSIFICAÇÃO 14 anos
AVALIAÇÃO ótimo

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