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"Os EUA têm obsessão pela violência"

Ator de "Precisamos Falar sobre o Kevin", que trata de matança em escola, diz que sociedade cria "instintos terríveis"

Revelado em filmes indies, o americano Ezra Miller, 19, concorreu com 500 garotos pelo papel

RAQUEL COZER
DE SÃO PAULO

Num extrato de "Precisamos Falar sobre o Kevin" divulgado na internet quando o filme concorria à Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2011, um Kevin ainda bebê chora ininterruptamente enquanto a mãe, Eva (Tilda Swinton), tenta acalmá-lo.

A paz, ou alguns segundos dela, Eva alcança só quando para com o carrinho perto de uma obra, e o choro se mistura ao som da britadeira.

O descompasso entre mãe e filho só cresce daí em diante, culminando com uma matança cometida por Kevin, agora adolescente, na escola.

A natureza do crime aparece nas sinopses do filme, que acaba de estrear no Brasil, e é quase tudo o que se pode falar sobre ele sem prejudicar seu impacto.

Baseado no romance homônimo de 2003 da americana Lionel Shriver, o longa-metragem da escocesa Lynne Ramsay foi esnobado pelo Oscar (esperava-se que pelo menos Tilda Swinton, que concorreu ao Globo de Ouro, fosse indicada como atriz).

Mas adapta com fidelidade, até onde a diferença de linguagens permite, o premiado romance de Shriver.

Com uma diferença. Se o livro é narrado do ponto de vista da mãe, com as limitações intencionais que essa visão proporciona, o filme se propõe a apresentar nuances mais complexas de Kevin.

INSTINTO

O personagem-título é vivido por três atores, além do bebê: Rock Duer, aos dois ou três anos; Jasper Newell, em torno dos sete anos; e Ezra Miller, a partir dos 15.

Numa época em que adolescentes se destacam em blockbusters no estilo "Crepúsculo", Ezra Miller é uma espécie de estrela em ascensão de filmes indies (como "Bastidores de um Casamento", lançado aqui em DVD) e séries (como "Californication").

Concorreu com quase 500 candidatos, e a diretora o escolheu, como já disse, por ser "o garoto mais esperto, mais instintivamente talentoso que você pode encontrar".

Tinha só seis anos em 1999, quando ocorreu o massacre do colégio Columbine, nos EUA, que inspirou o romance. Hoje, aos 19 anos, não poupa o próprio país ao analisar matanças do gênero.

"A sociedade americana tem obsessão pela violência, e a maneira como reprimimos isso forma instintos terríveis", diz à Folha, por telefone, com uma voz calma de quem estuda cada palavra.

"Temos fetiche pela notoriedade que a mídia dá a esses casos, numa espécie de paralelo à situação do filho chorando pela atenção da mãe."

Na visão de Ezra, é a atenção da mãe o que Kevin quer. "Não o vejo como sociopata, mas como um ser humano com percepção acima da média para o que o cerca."

O ator diz ter preferido não ler o livro de Shriver "para não se impregnar com a visão de Eva sobre o filho". Mas, fã de neurociência, foi buscar explicações em outros livros.

Concluiu que o choro do bebê Kevin seria só o reflexo do desconforto que a própria mãe sentia em relação a ele.

"Crianças são como esponjas ou espelhos. Quando nascem, o cérebro ainda está em formação. Qualquer coisa que aconteça a elas, uma parte do cérebro processa, e elas passam a reproduzir, ainda naquele estágio infantil."

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