Texto Anterior
|
Próximo Texto
| Índice | Comunicar Erros
Crítica história Anotações de Fest desnudam Albert Speer, o "bom nazista" RODRIGO LEVINOEDITOR-ASSISTENTE DA “ILUSTRADA” Entre 1967 e 1972, o jornalista alemão Joachim Fest (1926-2006), manteve encontros regulares com Albert Speer (1905-1981), em que tomava notas para o que seria a autobiografia do arquiteto-chefe do nazismo. À época, Speer já carregava o epíteto descabido de "o bom nazista", em grande parte fomentada pela condenação a 20 anos de prisão nos julgamentos de Nuremberg, quando a maioria dos seus pares foi condenado à morte. "Conversas Com Albert Speer", publicado agora no Brasil, reúne essas notas, que, mesmo desordenadas - embora o esforço tenaz de Fest por contextualizá-las-, ajudam a desnudar um dos personagens mais intrigantes do Terceiro Reich. Meticuloso, dissimulado, e, sobretudo, fiel a Hitler, Speer revela forçosamente -não raro as conversas com Fest se davam sob tensão e risco de rompimento- detalhes de sua relação com o ditador e as entranhas dos aspectos cruéis do regime. Mesmo que deles, por conveniência, tente se furtar. Vide o silêncio sobre a Noite dos Cristais, o famigerado massacre de judeus ocorrido em 1938. Ou o arroubo de cinismo quando aponta testemunhas que provariam a sua ausência durante a fala de Heirinch Himmler em outubro de 1943, quando o chefe da SS falou sem rodeios sobre o extermínio patrocinado pelos nazistas nos campos de concentração. Esquivo, ele arrisca capitaliza o rompimento com o líder antes da derrocada, alimentando a falácia do "nazista arrependido". Speer se negara a cumprir as ordens de Hitler para aplicar a política de terra arrasada, à beira da vitória aliada. Puro instinto de sobrevivência. A devoção dele ao chefe se mantinha viva e vem à tona na confissão da ida ao bunker, em Berlim, para se despedir. É um dos momentos mais reveladores do livro. Hitler, que mantivera Speer como seu confidente e com ele partilhava a apreciação doentia de obras arquitetônicas de escala gigantesca e a paixão por música erudita, recusa o cumprimento do capacho. A Fest, Speer confessa que teria um fim mais digno caso tivesse sido fuzilado pelo que restava das tropas. É uma confissão cristalina de fidelidade e paixão. O que torna, definitivamente, a expressão "bom nazista" um oxímoro.
CONVERSAS COM ALBERT SPEER |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |