Índice geral Ilustrada
Ilustrada
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Tostão usa futebol para falar da vida em livro de crônicas

'A Perfeição Não Existe', do selo Três Estrelas, reúne textos publicados na Folha

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

É claro que a perfeição não existe, como diz o título do livro de Eduardo Gonçalves de Andrade, que, escrito dessa forma, ninguém conhece, mas, quando chamado de Tostão, vira referência mundial de craque de futebol.

Mas bem que Tostão se esforçou, ao longo de seus 13 anos de Folha, para chegar tão perto da perfeição como cronista como o fizera nos campos de jogador,

É o que demonstra o livro, justamente por reunir suas colunas -ou crônicas, como prefiro chamá-las.

O normal é que esse tipo de coletânea acabe ficando datada. Um texto do ano 2000, lido em 2012, por exemplo, pode parecer arcaico.

Não é o caso da maioria das crônicas deste livro, pela simples mas suficiente razão de que Tostão não é apenas um ex-jogador, um médico, um professor de medicina, mas também -talvez, acima de tudo isso- um "observador da vida", como ele próprio costuma se definir.

Com todos esses chapéus, mais cursos de psicanálise, Tostão usa o futebol para passear pela vida, com observações sensatas e, por vezes, surpreendentes, que valem para um e para a outra.

Sua evidente obsessão com a crítica aos "idiotas da objetividade", expressão de Nelson Rodrigues, levou-o a escrever que "o supérfluo é essencial", algo que, nos tempos modernos, soa a heresia.

Mas a iconoclastia não é dominante nas crônicas recolhidas no livro. É verdade que Tostão revela há muitos anos uma certa irritação com o excesso de valor que se dá hoje aos técnicos de futebol, em detrimento das verdadeiras estrelas, que são obviamente os jogadores.

Mas, à margem dessa, digamos, contracultura, as crônicas revelam mais sentido comum ou bom senso do que qualquer outro ingrediente.

Até para avaliar a seleção da Copa de 1970, campeã do mundo e que a maioria dos brasileiros considera a melhor de todos os tempos, Tostão usa o sentido comum e uma modéstia incomum em grandes jogadores.

Escreve que revira os jogos da Copa de 1970 e ficara "fascinado com o talento e as jogadas maravilhosas daquele time", para emendar logo em seguida: "Mas vi também muitos erros".

Erros nele próprio: "Tostão, por exemplo, deu passes precisos e preciosos, facilitou as jogadas de todo o ataque, mas era lento e finalizava pouco para o gol".

Chega ao exagero de propor que sejam queimadas todas as fitas de vídeo daquele histórico mundial para que, em vez da realidade, "permaneça a lenda de que existiu no futebol mundial um time perfeito. O do Brasil campeão mundial de 70".

Você é capaz de imaginar que astros como Pelé, o maior de todos, Ronaldinho, Ronaldo, Romário e o mais recente candidato a astro, Neymar, digam algo assim sobre eles próprios e sobre as seleções que, com eles, foram campeãs (o que ainda não é o caso de Neymar)?

Uma das crônicas, já velha, de quase dois anos, grita que "o futebol brasileiro precisa reaprender a sonhar". É verdade. Mas, se e quando vier a fazê-lo, torço que o seu cronista esteja a postos para sonhar com ele, mas sem perder a perspectiva jamais.

A PERFEIÇÃO NÃO EXISTE

AUTOR Tostão
EDITORA Três Estrelas
QUANTO R$ 37 (288 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.