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Crítica Documentário "Marighella" faz mero retrato familiar do líder comunista INÁCIO ARAUJOCRÍTICO DA FOLHA Há dois Marighellas, em "Marighella". O primeiro, íntimo, irrompe nas primeiras imagens e da narrativa de Isa Ferraz Grinspum, autora do filme e sobrinha de Carlos Marighella. Ele é o tio misterioso, capaz de surgir e encantar a imaginação da menina, assim como de desaparecer sem mandar aviso e tão magicamente quanto surgia. Quem era esse tio Carlos? Eis a pergunta que motiva a pesquisa. Sua busca imbricará quase obrigatoriamente em duas direções: o personagem íntimo (narrado essencialmente, por sua viúva) e o líder político. Logo, porém, um problema se insinua que tornará difícil a resposta. O Marighella íntimo nunca se deixou conhecer, por razões óbvias: sendo todo o tempo procurado pela polícia, chegou ao extremo de viajar para a China sem que nem a mulher soubesse de seu paradeiro. Além de algumas observações genéricas sobre a juventude, a vida na escola, seu caráter baiano, sua mulatice, carisma com as mulheres, não demora a cairmos no Marighella político. Essa era, afinal, a sua vida. Aqui, no entanto, o documentário vale-se pouco de documentos e muito de depoimentos, que tendem a esclarecer aqui e ali alguns pontos sobre sua militância no Partido Comunista e, mais tarde, na ALN e, mais ainda, sobre episódios envolvendo a guerrilha que Marighella liderou. A chuva de elogios ao caráter e à bravura do líder comunista são possivelmente merecidos, mas, em definitivo, não servem ao filme, ajudando a criar uma imagem nem política nem íntima, mas antes de mais nada oficial desse personagem afinal bem relevante do século 20 brasileiro. É verdade que vez por outra um ex-militante nos introduz a aspectos da guerrilha (como o fato de os militantes conhecerem pouquíssimos outros membros da organização, no tempo da ALN), mas esse tipo de aspecto nunca é aprofundado. Da mesma forma, o espectador fica sem conhecer a intimidade linguística do movimento, e em nenhum momento é informado sobre por que, quando roubava um banco, a guerrilha chamava a isso de expropriação. Por fim, o setor imagem é um desastre. Quando se fala de um assalto a trem pagador, surgem de imediato cenas do filme de Roberto Farias. Se se fala de pescadores, entra um trecho de "Barravento". E assim vamos. À falta de conhecer efetivamente Marighella ficamos com esse retrato afinal tão familiar, em que ele se revela quase um santo proletário, cercado de imagens ilustrativas por todos os lados. Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros |
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