São Paulo, domingo, 12 de setembro de 2010

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DIÁRIO DE LONDRES
O MAPA DA CULTURA

A revolução dos bem-nascidos

O pop se aprende na escola

WILL HODGKINSON
tradução SANDRA M. STROPARO

NO PASSADO, NÓS, BRITÂNICOS, gostávamos quando nossos pop stars vinham da classe operária. Os Beatles são amados no mundo inteiro não só por seu brilhantismo musical, mas também porque eram quatro meninos pobres de Liverpool que fizeram sucesso apesar de todas as dificuldades. A maioria das grandes bandas ou estrelas, desde então, de Oasis a Amy Winehouse, veio de lares humildes. Em 2010, porém, alguma coisa estranha aconteceu. Gente chique tomou o pop de assalto.
A mais nova estrela da música britânica é Florence Welch. Com beleza de porcelana e estilo boêmio, Florence é uma presença marcante. Foi educada no colégio particular Alleyn, no sul de Londres, na mesma classe do colega pop star emergente Jack Penate.
Mumford & Sons foram o fenômeno de 2010: a primeira banda folk acústica a chegar ao topo das paradas. Marcus Mumford conheceu seus companheiros de banda no St. Paul's, colégio que vem educando as crianças da elite desde 1509. Jovens bandas descoladas como Foals e The Horrors, e mesmo a cantora Lily Allen, todos foram para escolas caras.
Por que a Revolução dos Bacanas está acontecendo? O país está em recessão brava, e em tempos difíceis as pessoas olham para trás, para as velhas certezas. Depois de 13 anos com os trabalhistas no poder, com David Cameron voltamos a um governo conservador. (Cameron estudou no Eton College, fundado em 1440 por Henrique 6º.)
Tradicionalmente, o pop sempre resistiu às classes mais altas. O cantor James Blunt padeceu com a imprensa em parte porque vem de uma família de líderes do Exército desde o ano 995. Joe Strummer, líder do Clash, raramente contou aos punks em seus shows que era filho de diplomata.
A grande esperança para 2011 é o filho de um grande advogado, Alan Pownall, possivelmente o primeiro cantor e compositor a se apresentar de "dockside" e suéter pendurado nos ombros, como quem acaba de saltar de um iate ancorado em Saint-Tropez.
Uma das explicações da Revolução dos Bacanas é que bem-nascidos como Pownall têm os meios para realizá-la. As duas bandas mais relevantes da onda britânica recente, Oasis e Arctic Monkeys, ambas com origem na classe operária, não conseguiram conquistar os EUA. Coldplay e Keane, que vêm de um meio mais privilegiado, fazem muito sucesso por lá.
"Diga o que quiser sobre as escolas particulares britânicas, mas elas trabalham duro com você e ensinam a ter respeito pelos outros", diz Tom Bridgewater, do selo independente Loose, que estudou em Eton. "Isso é bem útil quando se trata de conquistar a América, onde você precisa ser legal com todo mundo, do DJ local aos fãs adolescentes."
Bridgewater pensa em pular a ronda costumeira de casas noturnas e bares fedidos em busca de novos talentos e ir direto para as salas de música dos melhores colégios particulares. "Uma das razões para que todas essas bandas estejam aparecendo é que essas escolas têm ótimas instalações", diz. "Enquanto em outros tempos as crianças eram formadas para serem advogados ou políticos, agora são encorajadas para uma carreira de música pop, por professores mais jovens e antenados."
Talvez seja só uma questão de tempo para que a origem da lista de atrações de Glastonbury, nosso maior festival de música, seja os playgrounds de Eton.

A REVISTA PLAGUE
Em plena revolução da internet volta o interesse pela música folk, como se, num mundo digitalizado, as pessoas procurassem algo autêntico e tangível. Enquanto as publicações tentam se reinventar no mundo on-line, surge uma revista de folk que rejeita os tempos modernos com a boa e velha impressão e nenhuma presença na internet. "Os produtos digitais são muito descartáveis", diz o editor da "Plague", Crispin Parry. "Estamos fazendo algo relevante para os dias de hoje, mas que também pode ser lido daqui a dez anos e ainda ser contemporâneo."

TONY DA GATORRA
Um velho hippie brasileiro se tornou a última sensação na cena britânica de música ao vivo. Tony da Gatorra conserta TVs e é músico nas horas vagas. Imagino que não seja um grande sucesso no seu próprio país. Em 2007, Gruff Rhys, vocalista da banda galesa Super Furry Animals, topou com Tony numa casa noturna de São Paulo. Empolgado com o estilo e com a "gatorra", misto de bateria eletrônica e teclado artesanal inventado por Tony, Rhys trouxe-o para o Reino Unido para vários shows. Eu o vi no Bestival.


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