São Paulo, domingo, 19 de junho de 2011

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DIÁRIO DE LONDRES

Summertime

O verão aquece a agenda cultural londrina

VAGUINALDO MARINHEIRO

QUEM MORA NUM PAÍS tropical como o Brasil às vezes esquece como as mudanças de estação podem reordenar a rotina de uma cidade. Após o dezembro mais frio em cem anos, a primavera londrina foi a mais quente da história. A canícula muda o figurino das ruas: mulheres com microshorts e salto alto e homens de bermuda e chinelo desfilam por todo lugar.
A agenda cultural, recheada de eventos ao ar livre, segue a tendência de aquecimento dos termômetros.
Até 10/9, é possível assistir a bom teatro todos os dias entre as árvores do Regent's Park. Nesta semana, é a vez de "A Ópera do Mendigo", comédia musical de 1728 em que John Gay satiriza a burguesia pernóstica. A temporada segue com um "Péricles" juvenil e se encerra com "Crazy for You", de George e Ira Gershwin.
Com 1.400 lugares, o Regent's Park Open Theatre abriu suas portas em 1932; dois anos depois, Bernard Shaw (de "Pigmaleão") escreveria para o palco a céu aberto "The Six of Calais" (os seis de Calais), sobre os homens da cidade francesa que se sacrificaram pela população, subjugada por Eduardo 3º. A programação completa está em openairtheatre.com.

OS PRODUTORES
Começou ontem a temporada londrina de "Ricardo 3º", montagem dirigida por Sam Mendes e protagonizada por Kevin Spacey. A dupla volta a trabalhar junta, após o sucesso do filme "Beleza Americana" (1999).
O espetáculo fecha a parceria Bridge (ponte), firmada entre o Old Vic (teatro na margem sul do Tâmisa), a Brooklyn Academy of Music, de Nova York, e a produtora de Mendes. A ideia foi montar peças clássicas -como "Conto de Inverno", de Shakespeare, e "O Jardim das Cerejeiras", de Tchekhov- e apresentá-las nos dois países.
A recente premiação do Tony atestou a solidez do intercâmbio entre os palcos de Londres e Nova York. "War Horse", produção londrina em cartaz nas duas cidades, levou cinco prêmios, entre eles o de melhor peça.
Apesar do orgulho pelo reconhecimento, muito se questiona se o contribuinte deve financiar uma produção comercial da Broadway. Explica-se: o governo britânico subsidia, com recursos oriundos de impostos, grande parte do teatro do país. Mas já anunciou que, em tempos de cortes de gastos, a fonte será menos caudalosa.

FRENESI DA VINCI
A exposição só será aberta em novembro, mas já é "trending topic" no mundo das artes plásticas londrino. E por mais de uma razão. A primeira é o objeto sobre o qual se debruçará: Leonardo da Vinci (1452-1519). A segunda, o fato de mostras capitaneadas por grifes da história da arte terem tomado ares de fenômeno de massa.
A National Gallery, que abrigará os trabalhos, afirma que será a primeira vez que seu recorte para Leonardo privilegiará a pintura, e não o artista múltiplo e inventor. Para tanto, virão obras do Louvre, do Hermitage e do Vaticano. Do acervo próprio, aparecerá uma "A Virgem das Rochas" restaurada.
Durante a mostra, a galeria reduzirá o número de visitantes por dia. A cada meia hora, 180 pessoas terão acesso à exposição, contra as 230 habituais. É uma tentativa de permitir uma contemplação mais serena das telas, sem o acotovelamento que é praxe em alguns museus (no Louvre, por exemplo, em torno da Monalisa do mesmo Leonardo).

REPULSA AO SEXO
Egon Schiele (1890-1918) é um artista mais comentado do que visto, principalmente no Reino Unido, onde a última grande exposição de seus trabalhos ocorreu em 1989. Agora, 50 aquarelas estão em uma mostra na galeria Richard Nagy, até o fim do mês. Exibe-se todo o erotismo do pintor austríaco que morreu aos 28 anos, vítima da gripe espanhola. O foco recai sobre a representação feminina no período maduro do artista.
As obras que mostram pelos pubianos, seios, nádegas e o pênis ereto do pintor, motivo de escândalo na Viena do começo do século passado, provocaram a prisão de Schiele e a destruição de parte de sua produção. Hoje, não suscitam mais tanto alarido, o que permite dedicar mais atenção ao traço e ao uso da cor pelo pupilo de Klimt.
Menos tranquilos estão os curadores de uma exposição dedicada a René Magritte, a ser aberta nesta semana, em Liverpool. Ao lado de telas, estarão desenhos feitos para uma edição ilustrada (nunca publicada) de "Madame Edwarda", de Georges Bataille. Nesse conjunto, há, por exemplo, um homem que caminha para dentro de uma vagina. A curadoria diz que alertará os visitantes -para não chocar quem espera só deparar com homens de terno e chapéu-coco.


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