São Paulo, domingo, 11 de janeiro de 2004

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Horizonte amplo e densa vegetação ao alcance dos olhos valorizam morada em 30%

Verde põe preço do imóvel no azul

JULIANA GARÇON
FREE-LANCE PARA A FOLHA

"Da janela lateral do quarto de dormir/
Vejo uma igreja, um sinal de glória/
Vejo um muro branco e um vôo pássaro/
Vejo uma grade e um velho sinal."
Composta por Lô Borges e Fernando Brant, a "Paisagem da Janela" é traduzida em cifras pelo mercado imobiliário paulistano. Uma vista privilegiada, com uma área arborizada e horizonte amplo, pode elevar o valor do imóvel em cerca de 30%, conforme especialistas consultados pela Folha.
No mercado paulistano, as áreas verdes e horizontes vastos ganham importância comparável à de uma vista para o mar em cidades litorâneas. "Até há pouco tempo, bastava estar em andar alto para ter vista. Hoje, o importante é uma paisagem verde para potencializar o imóvel", diz Newman Amaral Brito, diretor comercial da Schahin Engenharia.
A valorização, analisa o urbanista João Sette Whitaker Ferreira, professor de pós-graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, deriva da escassez de regiões ao mesmo tempo aprazíveis e com boa infra-estrutura urbana.
As regiões já valorizadas, diz ele, tendem a ver seus lotes encarecerem ainda mais. "Veja o Panamby: tem fácil acesso, infra-estrutura completa, proximidade de centros comerciais e trechos de mata atlântica preservada. E como é Z1 [zona estritamente residencial], não sofrerá adensamento urbano", raciocina.
Já nas áreas mais tradicionais, como Jardins e Vila Nova Conceição, a tendência é manter "preços em patamares bem elevados, devido à falta de áreas disponíveis para novos empreendimentos", complementa Amaral Brito.

Acessível à vista
A paisagem da janela pode valorizar o imóvel, mas não é privilégio de uma clientela abastada.
Entre as opções para quem procura um panorama bucólico, José Augusto Viana Neto, presidente do Creci-SP (Conselho Regional dos Corretores de Imóveis de São Paulo), cita os parques da Água Branca (zona oeste) e da Aclimação (região central) e o Horto Florestal (zona norte), todos tradicionais da cidade.
Na Aclimação, o casal Flavia Rodrigues, 49, e Walter Troiani, 47, possui uma vista privilegiada para o parque. "Sempre estivemos perto do verde", conta Walter, que mora há seis anos com a família no apartamento de 250 m2 adquirido por US$ 500 mil na época da paridade cambial.
Bem menos luxuoso, o apartamento de 80 m2 da professora Maria Inês Nini da Luz possui vista comparável, debruçado sobre o lago do parque da Aclimação. "Acordo com a luz do sol ou com o ruído dos pássaros." O imóvel foi comprado há oito anos por cerca de R$ 90 mil. Atualmente, vale R$ 140 mil, estima a dona.

Gosto para tudo
A mancha verde e o horizonte largo, contudo, podem ser propiciados por um tipo de vizinho que não é unanimidade: o cemitério. Embora pareça incomodar cada vez menos os paulistanos, esse tipo de terreno causa arrepios a alguns moradores.
Terminal de ônibus, poço interno do edifício e janelas de outras residências são, por sua vez, vistas frequentemente reprovadas.
As favelas e as construções precárias também não chegam a ser um atrativo, mas, para parte dos vizinhos, não representam grande incômodo. A dona-de-casa Tânia Korukian não teve dúvidas ao comprar seu confortável apartamento, cuja varanda, com churrasqueira e piscina, debruça-se sobre a favela de Paraisópolis.
Ela não está, contudo, alheia à questão comercial. "Sabemos que esse apartamento, se vale US$ 500 mil, valeria US$ 1 milhão com outra paisagem", pondera.



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