São Paulo, domingo, 02 de novembro de 2008

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Muito oba-oba


O historiador militar Victor Hanson critica Obama por injetar racismo na campanha e diz que os 2 candidatos endurecerão as leis de imigração

ERNANE GUIMARÃES NETO
DA REDAÇÃO

Falando com o sotaque da elite pensante de Chicago, no Centro-Norte Ocidental dos EUA, Barack Hussein Obama 2º a um só tempo reúne o apelo multiétnico e a identidade aristocrática que agradam à mídia do eixo Washington-Nova York.
Para conservadores como Victor Davis Hanson, imprensa e eleitores compraram a imagem e descartaram a política ao apoiarem o democrata.
O comentarista político, associado à Hoover Institution, diz que o líder das pesquisas de intenção de voto é um "socialista europeu" -e que, se houvesse consciência disso, Obama não teria tanto apoio.
Para Hanson, o candidato republicano, John McCain, foi prejudicado apenas por defender a essência da política norte-americana num momento de baixa popularidade do atual presidente, seu correligionário George W. Bush.
Especialista em estudos clássicos e história militar, autor de "Por Que o Ocidente Venceu" (Ediouro), ele também diz, na entrevista abaixo, que o carisma de Obama tampouco pode ser decisivo na diplomacia norte-americana, pois as razões sistêmicas para amarem ou odiarem seu país continuarão as mesmas.

 

FOLHA - Um governo Obama significaria uma ascensão do racismo?
VICTOR DAVIS HANSON
- Vejamos desta forma: quase ninguém estava preocupado com a raça de Condoleezza Rice, a secretária de Estado, quase ninguém comentou a raça do secretário de Estado Colin Powell.
Mas, então, temos um candidato afro-americano que deliberadamente injeta o racismo na campanha, de modo inédito.
Obama insiste em transformar a raça numa questão: ele declarou que não se parece com as pessoas nas notas de dólar [ex-presidentes], disse que temia ataques racistas de seus oponentes e se cerca de figuras racialmente polarizadas.

FOLHA - Qualquer que seja o vencedor, o novo presidente será mais restritivo em relação à imigração?
HANSON
- Os EUA são o único país do mundo que permite a entrada de 1 milhão de pessoas ilegalmente [ao ano], além de ter o maior programa de imigração legal.
O próximo presidente terá de lidar com o problema de que entre 15 milhões e 20 milhões de pessoas entraram recentemente no país sem formação, sem falar inglês e ilegalmente, formando uma "subclasse" muito forte. A direita admitiu essa classe porque é mão-de-obra barata; a esquerda a vê como público potencial para ganho político futuro.
Quem observa os dados vê que um imigrante ilegal de 18 anos que atravessa a fronteira mexicana é um ganho para a economia americana até os 40, depois geralmente passa a usar os serviços sociais muito mais do que contribuiu; aos 70, já é um enorme peso financeiro.

FOLHA - Há necessidade de uma reforma urgente da imigração?
HANSON
- Sim. A construção da cerca de mil quilômetros [na fronteira com o México] e outros controles, além de algum desemprego, têm significado que menos gente tem imigrado.
Se conseguirmos diminuir para um número de 250 mil imigrantes totais, dos quais 100 mil legalizados, privilegiando o México e a América do Sul, então a capacidade de assimilação funcionará como no passado.
A posição não declarada de ambos os candidatos é fechar a fronteira a novos imigrantes ilegais; então, para que discutir programas de trabalho temporário, anistia, bilingüismo?

FOLHA - Em seus artigos, o sr. afirma que os aliados europeus esperam que prossiga a liderança geopolítica dos EUA. Em meio à atual crise, essa liderança ainda é possível?
HANSON
- Eles esperam que sim. É preciso examinar a crise financeira em termos relativos, não absolutos. Os EUA perderam US$ 2 trilhões, mas a maior parte foi para outros americanos -em outras palavras, houve perda de patrimônio com os empréstimos.
No caso da Europa, sabemos que pode haver até o dobro disso, mas o capital está emprestado na América do Sul, na Ásia e em partes da Europa Oriental -isto é, não irá circular novamente na União Européia.

FOLHA - E qual será o papel do próximo presidente nessas condições?
HANSON
- Psicologicamente, depois das guerras do Iraque e do Afeganistão e da perda de capital, a população não irá se dispor a ver o país assumir responsabilidades no exterior, mesmo que, materialmente, o país ainda esteja apto para isso.
Isso significa que, se Putin decidir cortar as fontes de petróleo para a Europa ou se o Irã anunciar que criará armas nucleares, o presidente Obama irá à ONU pedir que os aliados participem [da reação] ou pedirá a aliados regionais que intervenham.
Nada me convenceu, nos últimos 20 anos, de que essa abordagem funcionaria.
Gostem ou não, a maioria das pessoas já adotou um padrão de comportamento em que espera que os EUA tenham um postura de liderança. Criticam, mas, secretamente, esperam que os EUA façam isso -como depor Saddam Hussein ou Slobodan Milosevic, lidar com a Coréia do Norte ou Gaddafi.

FOLHA - O sr. critica os ataques da mídia contra Sarah Palin (vice na chapa de McCain). O tratamento é mais injusto com ela do que com Joe Biden (vice de Obama)?
HANSON
- Certamente. Sabemos tudo sobre Palin: quanto gasta em roupas, a gravidez de sua filha, o filho com síndrome de Down. Mesmo assim ela foi reduzida a uma mulher "do mato". Mas não se fala nada a respeito de Biden.
Vemos um desdém aristocrático por ela, entre conservadores e democratas, por ser de classe média, com o sotaque da classe média da Costa Oeste.

FOLHA - Economicamente, Obama será ruim para o Brasil?
HANSON
- O mundo se surpreenderá se Obama assumir a Presidência. Sua política comercial deve deixar os sul-americanos preocupados: ele ressuscitará tarifas protecionistas para setores ineficientes.
Já McCain disse que não entende como taxamos nossos aliados -como os brasileiros- e deixamos o petróleo de nossos rivais entrar no país sem tarifa nenhuma.


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