São Paulo, domingo, 03 de fevereiro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

+ contexto

"Esta é a faca para exploração e sobrevivência Brewer", disse Charlie. "Lâmina de aço inoxidável de 6 ¬ polegadas, Rockwell Hardness 56-58; serra de 2 polegadas partindo do cabo até a ponta; do lado esquerdo há um clinômetro de 180 graus, para calcular a altitude de montanhas; do lado direito, instruções para dar cinco sinais terra-ar. (...) Ela se converte em cortador de arame (...) Também pode ser convertida em arpão e comporta seis anzóis, uma linha de pesca de náilon, uma chumbada, uma lâmina "exacto", duas agulhas, três fósforos e uma agulha de sutura com material de sutura em anexo. É fabricada pela Marta, de Toledo, e importada aos EUA pela Gutman, a US$ 150 cada. Mas você e Simon podem ficar com uma. Ela é boa para arrancar couro de jacaré. E, quando os ianomamis atacarem, vocês vão poder costurar os buracos abertos pelas flechas." Em: "Trouble Again - A Journey Between the Orinoco and the Amazon" (Perigo Novamente - Uma Jornada entre o Orinoco e o Amazonas, Atlantic Monthly Press, EUA)

"Os ianomamis?"
"Isso mesmo. O povo mais violento do mundo. Alguns antropólogos acham que eles foram o primeiro povo a alcançar a América do Sul, vindo do Norte. Eles têm pele muito clara, e alguns têm olhos verdes. São o maior grupo de índios ainda intocados que restou na floresta amazônica. Os outros índios morrem de medo deles. Meu amigo Napoleon Chagnon intitulou seu livro sobre eles "The Fierce People" (O Povo Feroz) -vou lhe dar uma cópia, e também do livro de Jacques Lizot, "Tales of the Yanomami" (Contos dos Ianomamis). É tudo inteiramente compreensível -eles cultivam um pouco de banana-da-terra, mas, basicamente, vivem da caça e coleta, e não há muito o que comer nessas florestas. Assim, quando os tempos estão ruins, eles matam as meninas recém-nascidas; por isso, nunca há mulheres suficientes para todos os homens, e eles brigam por elas. Dentro da tribo, em duelos formalizados, eles se golpeiam uns aos outros na cabeça, com clavas de mais de três metros de comprimento. Fora da tribo, atacam as aldeias uns dos outros para roubar as mulheres e matam os homens inimigos com flechas de dois metros de comprimento com pontas mergulhadas em curare. Para piorar, eles não têm conceito de morte natural, de modo que, se alguém morre de febre, isso é visto como consequência de feitiço lançado por um xamã inimigo. Toda morte tem que ser vingada."
("Trevas no Eldorado")

Fiquei parado lá, como bobo, segurando a enorme faca Brewer Explorer. "E tudo isso ainda acontece hoje?", perguntei, assustado. "Estão se matando neste exato momento", respondeu Charlie.
Em: Claudia Andujar, "Yanomami", pág. 100

"Os antropólogos deixaram uma marca indelével sobre os ianomamis, tanto assim que a palavra "antro" passou a fazer parte do vocabulário deles, e não é um termo carinhoso. Para os índios, "antro" assumiu um significado oposto ao seu significado grego original, "homem" ("anthropos'). Os ianomamis enxergam o "antro" como um ser não-humano poderoso, dotado de tendências profundamente perturbadas e excentricidades malucas -um ser olímpio perturbado." Patrick Tierney

"Nossa terra e nossa floresta vão morrer apenas se o homem branco as destruir. Então os rios vão desaparecer, a terra vai secar, as árvores vão morrer e as pedras das montanhas vão rachar com o calor. Os espíritos xapiripé que vivem nas montanhas e brincam na mata vão fugir. Seus pais, os xamãs, não vão mais poder chamá-los para nos proteger. A terra-floresta vai ficar seca e vazia. Os xamãs não vão mais poder deter as epidemias de fumaça e os seres malignos que nos fazem adoecer. Assim, todos vão morrer."Davi Kopenawa Ianomami


Frases selecionadas por Clifford Geertz

Texto Anterior: Clifford Geertz: A vida entre os antros
Próximo Texto: Michel Leiris: A dupla tragédia da arte de tourear
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.