São Paulo, domingo, 03 de agosto de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Muralha virtual

Explosão da web na China, que já é o primeiro país em número de acessos, leva autoridades a criar novos controles, como a ciberpolícia

BRICE PEDROLETTI

Com 253 milhões de chineses conectados, segundo as últimas estatísticas do Centro de Informação de Rede de Internet da China (CNNIC, na sigla em inglês), o país é o primeiro do mundo em uso da rede, à frente dos EUA, que possuem cerca de 230 milhões de internautas.
O número de chineses que se conectam à internet (80% usam banda larga) saltou 56,2% desde junho de 2007. E a China ainda tem muito potencial, pois o índice de penetração da rede (de 19,1%) ainda é modesto -no mundo, esse índice é 21,1% em média, nos EUA e na Coréia do Sul ultrapassa os 71% e, na Índia, é de apenas 5,3%.
As apostas são grandes, tanto em termos econômicos quanto políticos. Pois nas residências chinesas existem hoje 84,7 milhões de computadores pessoais ligados à rede.
Três quartos dos internautas se conectam de suas casas, 39,2% em cibercafés, abertos 24 horas. Cerca de 107 milhões de chineses dizem ter um blog ou um espaço pessoal.
A música on-line lidera suas ocupações preferidas (84,5% das pessoas questionadas), seguida pelas notícias (81,5%), mensagens instantâneas (77,2%) e vídeos on-line (71%).

Mudando a mídia
Esse florescimento de canais de expressão e de informação abalou a situação política na China: em um contexto em que a mídia continua submetida à censura das autoridades e as pesquisas independentes são proibidas, a internet é o barômetro de uma opinião pública às vezes embrutecida, que não tem voz sobre o assunto.
A grande reatividade dos internautas catalisa mudanças na imprensa, que não pode ignorar os debates na rede.
"As reportagens de um cidadão blogueiro como Zola [pseudônimo] fizeram as autoridades compreenderem que era ilusório impor um blecaute de informação na era dos blogs. O regime tornou-se, portanto, mais sutil em sua abordagem.
Autorizou maior cobertura da mídia durante eventos como os levantes de Wengan [na Província de Guizhou, em junho], o que acabou por enfraquecer a influência dos blogs", avalia Rebecca MacKinnon, professora de novas mídias no Centro de Jornalismo da Universidade de Hong Kong.
Para manter o controle diante da formidável expansão da internet no país, Pequim empregou um arsenal legislativo, tecnológico e humano: é o caso da ciberpolícia ou, ainda, dos "comentaristas de internet", pagos pelo Partido Comunista.
A "grande muralha virtual" bloqueia assim o acesso a sites locais ou estrangeiros considerados delicados.
A concessão pelas autoridades de licenças aos grandes atores da web (portais, vídeos on-line, comunidades) permite obter a fidelidade destes últimos.
Assim, no final de junho a administração tutelar do audiovisual chinês concedeu licenças para 247 sites de vídeos chineses, mas... não aos três maiores (Youku, Tudou e 56), nos quais os internautas tendiam a colocar na rede filmes de incidentes perturbadores, às vezes captados por telefones celulares.
Um deles, 56.com, esteve inacessível mais de duas semanas antes de voltar a funcionar, provocando calafrios nos fundos americanos e japoneses que investiram milhões de dólares nele. Desde então, os três "YouTube" chineses compreenderam a lição.


Este texto foi publicado no "Le Monde". Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.


Texto Anterior: Censura fina
Próximo Texto: Trocando em miudinhos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.