São Paulo, domingo, 07 de novembro de 2004 |
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+ livros APÓS 15 ANOS SEM PUBLICAR, O CRÍTICO, MÚSICO E COMPOSITOR PAULISTA LANÇA DUAS NOVAS OBRAS, UMA DE PARTITURAS E OUTRA QUE REÚNE ENSAIOS E LONGA ENTREVISTA, DE QUE O MAIS! REPRODUZ TRECHOS A SEGUIR WISNIK SEM RECEITA
Arthur Nestrovski
Os antigos falavam em "annus mirabilis", "ano
miraculoso", para descrever um período como
esse que vive José Miguel Wisnik, 56. Desde o
lançamento do CD "Pérolas aos Poucos", em
fins de 2003, foram realizações e mais realizações, somando-se naturalmente umas às outras: a trilha para um novo
balé do grupo Corpo, em parceria com Caetano Veloso, a
participação muito especial na Flip (Festa Literária Internacional de Parati), as canções interpretadas e/ou gravadas por Gal Costa, Zélia Duncan e Djavan -sem falar em
Ná Ozzetti, que há muito canta suas músicas e agora vai
gravar mais duas-, os shows com Ná e Jussara Silveira
(em São Paulo, Porto Alegre, Rio, Salvador e outras cidades), o convite para escrever uma letra para Chico Buarque -a primeira vez na carreira em que Chico encomenda uma letra a alguém-, mais os dois livros que resumem, a seu modo, quase 20 anos de produção [e após 15
anos sem publicar]: o "Livro de Partituras" (ed. Gryphus)
e este, "Sem Receita" (Publifolha).
O título vem bem a propósito. Não há receita para um filólogo que é também compositor, um professor de literatura brasileira (na USP) que também é cantor popular, um
ensaísta de renome que é ainda um reconhecido pianista
(ou "uspianista", como ele diz). Vem mais a propósito ainda quando se pensa na sua tese sobre o "veneno remédio",
que para ele define uma singularidade da experiência brasileira, em que "toda significação é virtualmente equívoca", flutuando "num eixo de polaridades, cujo sinal pode
se inverter, a depender do acento que nela se imprima e do
recado que a atravesse".
A frase alude a Guimarães Rosa, comentado no ensaio
sobre "O Famigerado", onde ele estuda as persistências
"do arcaico no moderno" e a renovação da violência em
1.001 novas formas de arbítrio. Mas alude também a outro
remédio-veneno, na letra da canção "Sem Receita", parceria com a poeta Alice Ruiz, onde quem não tem receita somos todos nós, homens e mulheres, jogados uns aos outros para compor e recompor os afetos.
Artes da fala
Um dos palestrantes mais estimados do
país, Zé Miguel, na intimidade, pratica de modo análogo,
mas diferente, as artes da fala. Certo receio de entrar de
modo direto demais nas coisas -de estragar o sentido do
que se pensa e se sente pela falta de nuança, de romper a
teia humana que protege a experiência vivida com a faca
sem fio de palavras sem cuidado- provoca nele um certo
recato, uma certa reserva, cujo primeiro antídoto, auto-aplicado, é o humor. Entrevistá-lo implica, então, penetrar, de algum modo (mas não "surdamente"), no que
Drummond, um de seus poetas favoritos, chamou de "reino das palavras". |
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