São Paulo, domingo, 12 de outubro de 2008

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"EUA terão que aumentar impostos"


Professor na Sorbonne, historiador fala do trabalho em Paris, a "grande capital", e nos Emirados Árabes, pólo da economia emergente

ERNANE GUIMARÃES NETO
DA REDAÇÃO

Criado em 2006, o campus Abu Dhabi da Universidade de Paris-Sorbonne recebe pela segunda vez o professor Luiz Felipe de Alencastro, 62. Em sua passagem de duas semanas pelos Emirados Árabes Unidos, o historiador, autor do seminal "O Trato dos Viventes" (Cia. das Letras) -sobre o tráfico de escravos entre Brasil e África-, pode ver de perto o novo "pólo de ligação" entre o Ocidente e a economia asiática, que, em sua opinião, avulta como protagonista do século 21 [leia texto acima]. Em entrevista por telefone à Folha, Alencastro, que passará a escrever a cada dois meses no Mais!, diz que a preocupação, nas últimas semanas, com a crise financeira ainda não teve desdobramentos em um setor importante: a política internacional. "Agora é que estão começando a discutir isso."

 

FOLHA - Sobre que o sr. pretende escrever em sua coluna?
LUIZ FELIPE DE ALENCASTRO
- É interessante estar fora do Brasil, mas indo e voltando, há quase dez anos, estar numa grande capital européia. Havia um editor do "International Herald Tribune", jornal com sede em Paris, que reclamava das greves, de como o turno de 35 horas semanais prejudicava a empresa. Um jornalista francês perguntou por que ele não voltava para Londres: "Porque Londres não é uma grande capital européia". Quero falar, por exemplo, dos 200 anos da vinda da corte. Ela foi a ocidentalização do Brasil, o começo do progresso, mas também o momento da entrada no impasse histórico que foi o tráfico negreiro.

FOLHA - Como estudioso das relações entre metrópole e colônia, qual é sua opinião sobre o acordo ortográfico da língua portuguesa?
ALENCASTRO
- Sou favorável, é muito importante em nível internacional. Há uma marginalização de línguas secundárias, um dos problemas da globalização, e o fato de haver uma diferença muito escarpada entre as variantes prejudica o aprendizado [por estrangeiros].

FOLHA - O que faz em Abu Dhabi?
ALENCASTRO
- Leciono história da presença portuguesa na Ásia, em particular no Golfo Pérsico. Falo da rivalidade de Portugal não só com ingleses e holandeses, mas também com otomanos e persas.

FOLHA - Que outras atividades o sr. está desenvolvendo?
ALENCASTRO
- Estou preparando a versão brasileira de "O Império Português Frente aos Outros Impérios", que organizei a partir de um colóquio organizado na Sorbonne, com Francisco Bittencourt. Sairá em 2009 -ainda não posso dizer o nome da editora. Também em 2009 sai uma coletânea de artigos meus, pela Cia. das Letras.

FOLHA - Pretende voltar em definitivo ao Brasil?
ALENCASTRO
- Eu volto. Aqui [na Sorbonne] ainda faltam cinco anos para me aposentar. Mas passo férias no Brasil, participo sempre de eventos e colóquios.

FOLHA - Que elementos novos a atual crise financeira traz para a história econômica mundial?
ALENCASTRO
- Acabou a idéia de que o Estado não deve intervir na economia. Os EUA tentarão ajustar sua economia diminuindo o déficit, e isso implica aumentar impostos. O nível de vida da população deve cair, pois os americanos viviam do crédito. Estive na Universidade Brown, em 2002 e 2004, e ouvi brasileiros estranharem que, mesmo sem documentação nenhuma, conseguia-se empréstimo. Isso não voltará mais.


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