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Superproteção traz ainda mais danos
Bloqueio a sites atenta contra a liberdade, diz diretora da entidade internacional que coordena a internet
RODOLFO LUCENA
EDITOR DE INFORMÁTICA
A internet considera perniciosos os controles e as interferências governamentais, e os
internautas sempre dão um jeito de contornar as restrições,
ensina Susan Crawford, professora de direito cibernético e direito das comunicações na Cardozo Law School, em Nova
York, e diretora da Icann, a entidade internacional que coordena a internet.
Em entrevista realizada por
telefone, na quarta-feira, Crawford, 43, adverte que os prejuízos à liberdade de expressão e
de opção provocados pelo supercontrole da rede superam
em muito seus eventuais benefícios. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.
FOLHA - A internet pode ser controlada?
SUSAN CRAWFORD - A internet,
em si, é apenas um acordo para
que todos os computadores falem uma determinada linguagem. O acesso à internet pode
ser controlado, e os governos
podem determinar aos provedores de internet que estão fisicamente baseados em seus territórios que bloqueiem o acesso
a determinados sites. A maioria
dos países civilizados não faz isso. Nos EUA, uma ação governamental como essa seria considerada ilegal, uma violação à
Primeira Emenda, que garante
a liberdade de expreessão.
FOLHA - Como os governos devem
proceder em relação aos crimes na
internet?
CRAWFORD - Nos Estados Unidos, o governo tem o poder de
determinar a retirada de um site do ar se há pornografia infantil ou material obsceno no site.
Mas não tem o poder de fechar
um site pornográfico, porque
isso faz parte da liberdade de
expressão. Além disso, bloquear um site não tem sentido,
é vão, pois, como aconteceu no
caso da modelo brasileira, o vídeo fica aparecendo em outros
sites e de outras formas...
FOLHA - Cada ação governamental
pode ser burlada de alguma forma...
CRAWFORD - A internet considera a interferência como algo
pernicioso e dá sempre um jeito de contorná-la.
FOLHA - Mas essas infrações não
podem ser rastreados?
CRAWFORD - As agências policiais do mundo todo colaboram
entre si para rastrear as origens
dos vírus. Muitas vezes, têm sucesso. Depende. Nem sempre
prendem o criminoso, mas
conseguem rastreá-lo.
A mensagem mais importante e profunda aqui é a que os danos causados pela tentativa de
proteger as pessoas perfeitamente on-line supera em muito -muito mesmo- qualquer
benefício que possamos ter
com a suposta proteção que as
polícias ou governos possam
nos dar contra alguns embaraços ou crimes. Veja bem: se o
acesso for controlado tão rigidamente para que o governo
possa pegar os bandidos, isso
tem terríveis conseqüências
para os cidadãos comuns. Eles
não terão a liberdade de escolha, a liberdade de opções de
que precisam.
A resposta deveria ser permitir que as empresas e os indivíduos, que formam a periferia da
rede, encontrem formas de se
proteger, em vez de a parte central da rede proteger os outros.
FOLHA - Ou seja, cada um deve ser
responsável pela defesa de seus arquivos e pelo que faz na rede.
CRAWFORD - O que precisamos
fazer é ajudar as pessoas, treiná-las para que sejam capazes
de fazer isso, instalar antivírus,
configurar as defesas de seus
programas de navegação na internet. Os indivíduos podem fazer isso sozinhos, com alguma
ajuda. Isso requer educação e
assistência, mas não controle
governamental da internet.
FOLHA - Mas, quando um um indivíduo se sente ofendido, ele pode
buscar apoio legal.
CRAWFORD - Pode. Mas também pode simplesmente ignorar a ofensa. Ou responder on-line. Há muitas formas de cada
um mostrar o seu lado sem recorrer ao sistema judicial.
FOLHA - Às vezes, a disputa é desigual, de cidadãos contra empresas
ou homens poderosos. Os jornais
sempre foram alvo de processos...
CRAWFORD - Nós estamos num
mundo muito diferente hoje
em dia, uma era em que os jornais já não têm o monopólio da
informação, das notícias. A legislação foi projetada para uma
era em que havia um único megafone, um único amplificador,
que era o grande jornal da cidade. Se, naquela época, um jornal dissesse algo que era falso
ou difamatório, um cidadão comum não tinha aonde ir, porque os jornais eram tão poderosos. Hoje é muito diferente. No
mundo on-line, há muitas formas de responder, de mostrar
às pessoas que você foi ofendido ou tratado de forma incorreta. Nada disso exige o recurso à
Justiça, porque hoje em dia cada um pode ser um editor.
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