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A era da inocência
"Virgens - Uma História Cultural" traça um panorama do tema e discute o retorno do preconceito hoje
LIONEL SHRIVER
Em "Virgins - A Cultural History" [Virgens
-Uma História Cultural, ed. Granta, 232
págs., 18,99, R$ 70],
a acadêmica Anke Bernau, da
Universidade de Manchester,
demonstra que, mesmo no Ocidente mundano, a questão da
virgindade está longe de resolvida. Em parte uma situação
clínica, em parte uma metáfora, a virgindade continua vaga
em sua definição. O sexo homossexual, anal ou oral "contam"? Se uma virgem é violentada, continua pura?
De modo igualmente primitivo, o pensamento ocidental
dominante há muito hesita sobre se a virgindade é uma coisa
boa ou ruim, um debate que
ocupa grande parte da história
envolvente e legível de Bernau.
Apesar da ênfase histórica no
Ocidente para que as mulheres
sejam "invioladas" até o casamento e as terríveis conseqüências sociais impostas às
mulheres que se desviam, corroborar a virgindade vaginal é
até hoje medicamente impossível. Um hímen "intacto" não é
um indício seguro, quando tantas mulheres rompem a fina
membrana na infância ou mesmo nunca tiveram uma.
Isso não impediu, ao longo
da história, uma profusão de
teorias sobre como distinguir
- na gíria contemporânea - as
"piranhas" das "santas".
Mas "Virgens" não apenas
critica a ignorância do passado
em comparação com o esclarecimento do presente. Enquanto a condição do hímen é virtualmente insignificante, a
"restauração de hímen" é uma
forma de cirurgia plástica cada
vez mais procurada.
Além disso, a virgindade continua em destaque na agenda
da direita americana, e a abordagem de "abstinência total"
silenciosamente tomou conta
da educação sexual convencional nas escolas públicas dos Estados Unidos. Estudos sugerem que os currículos que promovem a virgindade até o casamento quase não adiam a atividade sexual dos adolescentes, e
a recusa a dar informações médicas pode estar ajudando a
disseminar doenças venéreas.
Mais reflexiva que didática,
Bernau explora a atual ambivalência ocidental sobre preferir
mulheres lascivas ou puras.
"Os conceitos de prostituta e
virgem vêm a ser dois lados da
mesma moeda", supõe Bernau.
"Um não tem sentido sem o outro, e uma virgem certamente
está sempre sob a suspeita de
se transformar em prostituta
-ou de já ser uma, mesmo que
só em pensamentos."
"Virgens" não é um libelo feminista. Calmo, às vezes meditativo, deixa os fatos falarem
por si, mesmo que em trechos
sobre a educação sexual de
"abstinência total" se possa
sentir uma raiva pulsante.
A íntegra deste texto saiu no "Financial Times".
Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves.
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