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Amanhã
Estas associações são um elemento perturbador da continuidade que
deve presidir ao esforço comum
Despertará festiva a capital
da República.
Sobrepondo-se a data
mais humana de nossa história e a qual, sob o ponto de vista filosófico, aliou melhor à evolução geral a civilização de nosso país. É bem
natural, pois, que como toda a gente
nos sintamos felizes, nós que certamente estamos destinados a muitas
vezes comemorá-la entre os deslumbramentos do futuro.
Compreendemos, pois, toda essa
alacridade feliz que, dominando todas as classes, revela-as e impulsiona-as. E como todos, como todos
que pensam e que sentem, demarcaremos os minutos desse dia com o
ritmo febril de nossos corações.
No entanto, considerando em torno, fixando os aprestos da cerimônia, perturba-nos a imagem a mais
desoladora.
Um protesto, profundamente meditado, reflexo imaculado de algumas consciências noveis mas talvez,
por isso mesmo, puras -definiu-nos uma posição singular, em meio
da agitação geral.
Festas de amanhã
Sem ferir os indivíduos ou as classes, pois que as associações condenadas comportam representantes
de todas elas, antes obedecendo unicamente à consideração nobilíssima
de que estas associações, pelos seus
destinos são -socialmente- um
elemento perturbador da continuidade que deve presidir ao esforço
comum e -moralmente- profundamente nocivas à alma humana, vimo-nos inopinadamente agredidos
pela reprovação geral -não nos restando nem sequer o apoio dos companheiros que conosco meditam sobre os mesmos livros!...
No entanto -envolva-nos embora a atrabilis ou o humorismo de
muitos- sentimo-nos admiravelmente bem, nesta posição.
Para nós a Pátria nada mais é do
que a generalização da família; a par
de responsabilidades e esforços
maiores, temos por ela, idêntica em
tudo, a veneração imaculada, que é
todo o encanto dos nossos lares.
As festas nacionais, instituídas pela República, nada mais são do que a
manifestação exterior deste culto e
como não justificar pois que seja, para nós, um sacrilégio o desdobrarem-se sobre elas os estandartes impuros, dos que realizam nos tempos
de hoje as lupercaes antigas?
Firmamos ante as consciências esta interrogação.
Não nos eximiremos, contudo, às
festas de amanhã.
Deslumbrar-se-á, feliz, a capital da
República; todas as classes irmanadas por um sentimento generoso,
desdobrar-se-ão num longo cortejo
rutilante e harmonioso e, para caracterizar melhor o tom feliz da festa,
circundar-se-á com os guizos do
carnaval a majestosa expansão da alma popular.
Nós festejaremos também o dia de
amanhã; mas de outra maneira.
Sós, em minoria extrema, mas felizes por estarmos sós, pois que este
isolamento, como o das águias, explica-se pela altitude, iremos aos túmulos dos valentes que se acolheram à história; legando-nos o impulso inicial da ascensão das nossas
idéias e dos nossos sentimentos.
Produto consciente
Adaptando às condições atuais o
delicadíssimo pensamento de Luiz
Blanc acerca da ação maravilhosa
dos mortos ilustres sobre o destino
humano, saudaremos as memórias
augustas de Paranhos e Ferreira de
Menezes.
Cada um desses nomes é a síntese
de gerações que de há muito bateram-se pela nobilitação de um povo.
Voltarmo-nos para eles, aproximarmo-nos de seus túmulos imortais, equivale a robustecerem-se em
nossa alma os elementos nobilíssimos dessa extraordinária solidariedade humana, que, fixando através
da história os labores de gerações,
cria a evolução, a fórmula mais positiva do progresso.
Relembram-nos caracteres inquebráveis, que entregues aos embates
das mais perigosas lutas, nos choques das mais poderosas paixões,
delas emergiam como os diamantes,
mais rígidos e fulgurantes.
Em torno de seus túmulos imortais alentaremos melhor esse imenso
amor à Pátria que tem para nós,
mais do que a fragilidade de uma expressão afetiva, a feição austera de
um produto consciente, pois que é a
sistematização brilhantíssima de todos os nossos sonhos no futuro, aliado a todos os esforços, a todas as esperanças, todos os ideais que iluminaram as grandes consciências do
passado.
O batalhão acadêmico manifestar-se-á, pois -sem destoar do sentimento geral-, sob uma forma profundamente honesta e profundamente altiva.
2º tenente Euclides da Cunha
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