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Resposta à Confederação
Seria solução
tirar um preto da fazenda,
libertá-lo e
convertê-lo num vagabundo
e capoeira
no interior da capital?
[...] Releve-nos a Confederação
Abolicionista o dizermos-lhe que
não pode se arrogar a única representante do abolicionismo no Brasil
e que nessa matéria tem contra si
graves e ponderosas acusações.
Os filósofos, os que seguem a doutrina positivista sistematicamente (e
nós, que não somos membros do
Apostolado Positivista e podemos
dizer com toda isenção de ânimo),
não se dedignam de ombrear com as
classes operárias, com os desprovidos da fortuna, não só porque são os
que se colocam ao seu lado para clamar contra todos os privilégios e
monopólios burocráticos de nossa
sociedade como tem em sua sala ao
lado dos grandes, dos mais elevados
fatores da civilização humana, representados por bustos e retratos de
um preto, retrato que podemos afirmar não existe na sede da Confederação Abolicionista nem nas casas
de seus membros; retrato do grande
e ilustre preto libertador do Haiti, o
primeiro entre os mártires da liberdade de sua raça -o grande Toussaint-Louverture. [...]
Quando a Confederação Abolicionista ainda não sonhava em surgir,
em 1864, uma distinta brasileira, d.
Nizia Floresta Brasileira Augusta,
sob a inspiração do Mestre na sua
obra escrita no estrangeiro, apresentava alguns remédios morais para o
mal que nos maculava. Em 1865 o sr.
Brandão, em Bruxelas, escrevia um
opúsculo em que se dizia positivista,
e combatia a monstruosa posse.
Em 1879, quando ainda os srs. Teixeira Mendes e Miguel Lemos não
eram positivistas sistemáticos, em
uns panfletos que então publicaram,
de crítica ao imperador, o sr. Teixeira Mendes sustentou perante o direito criminal a tese de que o escravo
que matasse ao seu senhor não tinha
crime. Em setembro de 1880, pouco
antes da fundação definitiva do Centro Positivista, os srs. Teixeira Mendes, drs. Teixeira de Souza, Anníbal
Falcão, João Francisco de Souza e
Generino dos Santos, assinavam um
artigo que foi publicado em suplemento da "Gazeta da Tarde", de propriedade então do falecido Ferreira
de Menezes de saudosa memória.
Cofres sociais
Nesse artigo não só vinha a condenação a mais enérgica a esse incalculável mal como vinha o remédio
num projeto abolicionista que, se
fosse executado, nossa situação econômica e social seria outra.
Daí há pouco tempo forma-se esse
Centro que consagrou nas suas bases a condição de que, para ser a ele
pertencente, era indispensável que o
pretendente não possuísse escravos
de forma nenhuma, isto é, por compra, herança, donativo ou empréstimos, e fazer a essa associação de então para cá uma propaganda ativa e
incansada.
Foi nessa propaganda que resultou o considerar-se o problema, não
como consistente simplesmente na
libertação dos escravos, o fazer-se
justiça a essa raça, mostrando que a
sua libertação não era simplesmente
uma questão de comiseração, para
que nós lhe éramos devedores das
principais afetividades do coração
brasileiro, visto a raça preta africana
ser muito superior em afetividade à
raça branca.
Ora, a Confederação Abolicionista
só se formou depois que existiam
nesta capital muitas sociedades com
esse fim e que se congregavam e
quando já no país inteiro lavrava
uma enorme opinião favorável à
questão -o que não impede que
muitos de seus membros fossem batalhadores de todos os tempos.
Quanto às sociedades carnavalescas, diremos que elas não fizeram
benefícios à libertação dos escravos,
como tais, pois que o seu fim não era
esse, e sim o divertimento por meio
das orgias, e, se muitos de seus
membros concorreram, isso será tomado na conta em que o deve ser; e
ainda mais se o dinheiro tirado para
a libertação dos escravos saiu dos
cofres sociais, não foi mais do que as
migalhas; as sobras das orgias, porque essas sociedades, se tivessem esse espírito de filantropia e abolicionista que se lhes quer dar, preferiam
empregar as centenas de contos que
gastavam nas orgias em resgatar a liberdade de seus semelhantes.
Demais seria solução tirar um preto da fazenda, libertá-lo e convertê-lo num vagabundo e capoeira no interior da capital?
Queremos que nos diga a Confederação Abolicionista que diferença
existe entre a prostituição nas senzalas e a prostituição nos clubes aqui
no centro da cidade?
Os artistas de companhias que
aqui fizeram benefícios à libertação
dos escravos não o fizeram como representantes das companhias, cujo
fim nunca foi a abolição, e sim como
indivíduos de bons sentimentos. Isto ainda é mais uma prova de que,
quer queiram, quer não, o altruísmo
há de dominar as ações humanas.
Os clubes de corridas como as sociedades carnavalescas não tiveram
nunca por fim a libertação dos escravos e nem como tal tomaram parte e
sim como levados pelos impulsos do
coração de alguns de seus membros
e nem por isso deixam como aquelas
de ser profundamente imorais. [...]
A Confederação Abolicionista
quer fazer uma festa popular e no
entanto manda convites especiais a
essas sociedades e não convida especialmente o elenco popular que devia ser a nota dominante da festa;
não convida os libertos para virem
incorporados render homenagem
aos grandes vultos da abolição. Não
são as casacas e os carros ricos espalhados em profusão que fazem a popularidade e grandeza da festa. [...]
Nova exploração
Ainda mais, desculpe-nos a Confederação que lhe digamos francamente, não acreditamos em seus
sentimentos abolicionistas, pois
que, no dia seguinte ao da libertação
dos escravos -quando o problema
era mais ingente, por consistir em
inocular naqueles cérebros obcecados e corações deprimidos pela mais
infamante das instituições, o amor
da Pátria, o amor ao trabalho e à família, as nomeações intelectuais as
mais indispensáveis ao operário para incorporá-lo definitivamente na
sociedade- fazia o contrário, concorria para anulá-lo, desorganizando o trabalho e tornando o braço
que devia ser a seguir a tranqüilidade da família, a prosperidade da Pátria pelo trabalho profícuo e moralizado, no braço armado do sicário,
que devia por em sobressalto todas
as consciências e todas as famílias,
concorrendo assim para uma nefanda e nova exploração dessa miserável raça, secularmente espoliada, pela criação e animação da célebre
Guarda Negra.
E após tanto tempo passado vem-se com a panacéia das creches. Perguntamos que diferença há em segregar o pequeno de sua mãe para
que esta alimente o filho de seu senhor e em colocá-lo na creche para
que ela vá para a oficina, dar o seu
esforço ao patrão? Por um e outro
modo não se desorganiza a família
operária?
Rio de Janeiro, 10 de maio de 1890
Saturnino Nicoláo Cardoso
N. no Rio Grande do Sul em 1858
Rua do Lavradio 139
Thomaz Cavalcanti de
Albuquerque
N. no Ceará em 1855
Rua da Floresta n. 21
Euclides da Cunha
N. no Rio de Janeiro em 1867
Campo de S. Cristovão 18
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