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Vida sem clichês
HORÁRIOS SÃO RÍGIDOS, E INTERNOS SÃO OBRIGADOS A LIMPAR DIARIAMENTE AS PRÓPRIAS CELAS
DO ENVIADO A DUEÑAS
Não há sinal de
carcereiros mal-encarados carregando pesados
molhos de chave
em corredores escuros e fétidos. Tampouco se percebe
qualquer tensão no ar, prestes a explodir em brigas de
gangues movidas a estiletes
improvisados.
Em La Moraleja, os clichês
do cinema e da vida real que
costumam ser associados às
prisões estão praticamente
ausentes, embora ninguém
jamais se esqueça de onde está. "Aqui tem cinema, ginásio
esportivo, piscina, aula de
idiomas, biblioteca -as condições são excelentes para
uma prisão. Só não tem liberdade", diz o paranaense Paulo Teixeira, que conserta raquetes de tênis e bolas de futebol rasgadas numa das várias oficinas do presídio.
Ao contrário da maioria,
ele não descarrega sua frustração no país que o mantém
preso. "Não tenho raiva dos
espanhóis. Eles estão certos."
O diretor, Jesús Hernando
de la Rosa, descreve a rotina
de La Moraleja: "Às 8h30 eles
são despertados, têm meia
hora para arrumar a cela, tomar banho e descer para o café da manhã".
"É quando acontece a primeira contagem. Depois do
café, cada um vai para a sua
atividade. Os 350 que trabalham vão para as oficinas. Os
demais fazem o que quiserem: aulas de idiomas, esportes ou ficar no pátio tomando
sol, sem fazer nada", explica.
"Às 13h voltam para seus
módulos para comer. Almoçam e às 14h sobem para as
celas, onde ficam até as
16h30. É quando ocorre a segunda contagem e a troca da
equipe. A rotina da manhã se
repete, cada um com sua atividade. Às 19h voltam a seus
módulos e jantam. Acontece
a última contagem e, às 20h,
sobem para as suas celas, onde ficam até o dia seguinte."
As celas, de cerca de 5 metros quadrados, são habitadas
por dois detentos cada, que
dormem em beliches. Todas
têm ducha, uma pia e TV e
poderiam ser confundidas
com os quartos de um desses
hotéis de negócios de baixo
custo. Pelas regras do presídio, elas têm que estar sempre limpas e arrumadas.
O que diferencia uma da
outra é o quadro de fotos, que
cada detento usa como quer.
Uns colam fotos da família,
outros fotos pornográficas e
retratos de ídolos da música e
do futebol. O Barcelona, de
Ronaldinho Gaúcho, é um
dos favoritos.
Apenas 51 mulheres habitam La Moraleja, o que as torna objetos de extrema cobiça.
Quase todas mantêm namoros dentro do presídio, onde
uma unidade à parte é usada
para o que eles chamam de
"vis-a-vis", as visitas íntimas.
As três brasileiras presas em
La Moraleja são comprometidas com detentos.
"O namoro aqui tem regras", conta a paulista Iamara, que engravidou do namorado guatemalteco dentro do
presídio, depois de ser deixada pelo marido, com quem vivia em Catanduva.
"Primeiro trocamos cartas
por três meses. Depois vêm
os encontros no locutório,
onde ficamos separados por
um vidro. Só com mais três
meses de namoro é que podemos pedir o "vis-a-vis". São
seis visitas íntimas por mês."
Se não conseguir a liberdade
que almeja em agosto, quando terá cumprido 3/4 da pena, Iramaia poderá cuidar do
filho na unidade especial para
mães no presídio.
Atualmente há 11 crianças
na unidade. Até pouco tempo
atrás, uma delas era a menina
Gabriela, filha da brasileira
Juvinette Ribeiro. Ao completar três anos foi entregue a
uma família adotiva de Dueñas, que cuidará da menina
até Juvinette sair da prisão,
onde cumpre pena de dez
anos por tráfico.
Para os homens, que são a
ampla maioria, a vida é mais
solitária. Ao contrário das
prisões nacionais, em La Moraleja o dia de visitas é o mais
doloroso. "É muito duro ver
casais e famílias no locutório,
sem ter com quem conversar", diz Paulo, que divide a
cela com o paulista Giovani.
"Aqui dentro só temos a nós
mesmos."
(MARCELO NINIO)
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