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+ Cultura
A ascensão do spanglish
Professor dos EUA prepara tradução do "Quixote"
para idioma que funde
inglês e espanhol
MOACYR SCLIAR
COLUNISTA DA FOLHA
I
lan Stavans é um homem
ainda jovem, mas o seu
currículo impressiona pelo tamanho e pela qualidade. Ex-professor da
Universidade Columbia e atual
professor de cultura latino-americana no prestigioso Amherst College, em Massachusetts, Stavans é autor de várias
obras, entre elas o best-seller
"The Hispanic Condition" (A
Condição Hispânica, 1995,
Harper) e "On Borrowed
Words" (Sobre Palavras Emprestadas, 2001, Penguin).
Editou "The Oxford Book of
Jewish Stories" (O Livro Oxford de Histórias Judaicas,
1998, Oxford University Press),
"The Poetry of Pablo Neruda"
(A Poesia de Pablo Neruda,
2003, Farrar, Straus and Giroux), "Isaac Bashevis Singer
-Collected Stories" (Contos
Recolhidos, 2004, Library of
America), "The Schocken Book
of Modern Sephardic Literature" (O Livro Schocken de Literatura Sefardita Moderna,
2005, Schocken) e a "Encyclopedia Latina" (2005, Grolier),
em quatro volumes, a primeira
obra de referência sobre a vida
hispânica nos EUA.
Sua ficção inclui "The Disappearance - A Novella and Stories" (O Desaparecimento
-Uma Novela e Contos, 2006;
desses contos, um foi adaptado
para o cinema ["Morirse Está
en Hebreo", produção mexicana]). A editora Routledge publicou uma antologia de sua
obra, intitulada "The Essential
Ilan Stavans" (2000).
Seu último livro, "On Love",
está sendo lançado neste ano
pela Yale University Press.
Novo Octavio Paz
O "New York Times" o classifica como o mais influente representante da cultura hispânica nos EUA e o "San Francisco
Chronicle" o vê como "o Octavio Paz contemporâneo" -o
que se explica pela própria trajetória de Stavans.
Descendente de imigrantes
judeus da Europa Oriental que
se fixaram no México, mudou-se para os EUA e se tornou o elo
vivo entre as duas culturas.
Interessou-se particularmente pelo spanglish, o idioma
híbrido que está se tornando
uma espécie de segunda língua
nos EUA, falado por milhões de
imigrantes mexicanos e de outros países da América Central
e América do Sul e do qual já coletou mais de 6.000 termos.
"O spanglish não é somente
um fenômeno lingüístico, é
uma revolução cultural que
afeta profundamente as Américas", diz Stavans.
O spanglish permeia todos os
ramos da cultura, a literatura, a
música, a educação, a política, e
isso há várias gerações: a imigração mexicana para os EUA
data de pelo menos 1848, quando foi firmado um tratado permitindo a entrada de pessoas
vindas do México (coisa que
agora está sendo rejeitada).
Resulta daí uma intensa polêmica entre os partidários da
assimilação cultural, que vêem
no spanglish um caminho para
tal, e os puristas de ambos os
idiomas, o inglês e o espanhol,
que falam na "verborréia dos
ignorantes".
De outra parte, existe no público americano um grande interesse pela obra de escritores
de origem latina nascidos nos
EUA, como Julia Alvarez [de
"Antes da Liberdade", Cia. das
Letras], Rudolfo Anaya [de "Albuquerque", University of New
Mexico] e Cristina García [de
"Dreaming in Cuban", Sonhar
em Cubano, ed. Ballantine].
Esse interesse contrasta com
o relativo abandono em que se
encontra a literatura latino-americana depois do boom dos
anos 1960 e 1970.
A propósito, Ilan Stavans está traduzindo para o spanglish
o "Dom Quixote", de Cervantes. A primeira frase, que em espanhol é "En un lugar de la
Mancha, de cuyo nombre no
quiero acordarme, no ha mucho tiempo que vivía un hidalgo
de los de lanza en astillero,
adarga antigua, rocín flaco y
galgo corredor" e, em português (trad. de Carlos Nougué e
José Luis Sánchez, ed. Record),
"num vilarejo da Mancha, de
cujo nome não quero lembrar-me, não há muito tempo vivia
um fidalgo dos de lança em lanceiro, adarga antiga, rocim magro e cão corredor".
"Esos gentlemen"
Em spanglish, fica: "En un
placete de La Mancha of which
nombre no quiero remembrearme, vivía, not so long ago,
uno de esos gentlemen who always tienen una lanza in the
rack, una buckler antigua, a
skinny caballo y un grayhound
para el chase".
Não é impossível, diz Ilan
Stavans, que algo semelhante
ocorra com a crescente diáspora brasileira nos EUA, com o
surgimento de um "portinglês"
semelhante ao "portunhol".
Ou seja, a globalização está
de fato mudando a vida das pessoas, e isso se traduz no surgimento de novos idiomas -e de
novas culturas.
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