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Renúncia à língua
N
ão escrevo mais como
antes, o que equivale a
dizer que não escrevo
mais. A princípio, quando comecei a fazer cinema, pensei
que fosse apenas a adoção de
uma técnica diferente, quase
uma técnica literária diversa.
Mas depois, pouco a pouco,
percebi que se trata da adoção
de uma língua diferente.
Então abandonei a língua
italiana, com a qual me expressava como escritor, e adotei a
língua cinematográfica. Disse
várias vezes, por puro protesto,
contestação total, que eu gostaria de renunciar à nacionalidade italiana. Ao fazer cinema, renunciei à língua italiana, isto é,
à minha nacionalidade.
Mas a verdade é outra, talvez
mais complicada e profunda: a
língua exprime a realidade por
meio de um sistema de signos.
Já o cineasta exprime a realidade por meio da realidade. Essa
talvez seja a razão de gostar do
cinema, de preferi-lo, pois, ao
exprimir a realidade como realidade, opero e vivo continuamente no nível da realidade.
Não nos importamos nem
um pouco com a poesia. Usamos a palavra "flor" porque ela
nos serve em nossas relações
humanas. As imagens, ao contrário, fundam-se nas imagens
dos sonhos e da memória.
Quando sonhamos e recordamos, rodamos dentro de nós
pequenos filmes. Isso quer dizer que o cinema tem seus fundamentos e suas raízes numa
linguagem completamente irracional, irracionalista. [...]No
fundo, quando alguém vê um
filme, tem a impressão de ter
sonhado.
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