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PM de algemas
Para antropóloga, sociedade vê corporação como "a Geni do serviço público", mas mandatos dos policiais são um "cheque em branco"
DA SUCURSAL DO RIO
Estado ambulante" e
principal tomador de
decisões, o policial militar vive a insegurança de ter um "mandato" indefinido, "um cheque em
branco", ao mesmo tempo em
que é submetido a pressões e
desautorizado a todo momento. A avaliação é da antropóloga
Jaqueline Muniz, professora
do mestrado em direito da Universidade Cândido Mendes, no
Rio, e autora da tese de doutorado "Ser Policial É Sobretudo
uma Razão de Ser" (trecho da
"Canção do Policial Militar").
Para ela, o policial vive no
"limbo", na indefinição do que
pode ou não pode fazer, e o saber aprendido no cotidiano da
rua não é levado à escola.
Muniz considera que comentários de PMs do curso demonstram "sensibilidade crítica e política, lucidez".
Para ela, o problema está no
"mandato em aberto, que torna
o PM mais vulnerável que o
bandido". A ausência de regras
aumenta a violência e dificulta
o controle da polícia.
"É um cheque em branco, de
que cada um se apropria e
preenche como deseja, porque
o mandato não está normatizado de maneira clara."
"Até onde vai o mandato do
policial? O PM é o tempo todo
desautorizado e não está preparado para tomar decisões. Na
ausência de clareza, ele se sabe
inseguro, e todo uso de força é
considerado violência. Aí tende
a agir com mais força que o necessário. Quanto menor a confiança, mais violência. O mandato do policial está foragido."
Para ela, os PMs são violentos "não por serem facínoras",
mas porque não há política de
uso da força. "A violência é uma
resposta. Quem se responsabiliza? O que aceitamos? Achamos que o PM é faxineiro social, a "Geni" do serviço público.
A corrupção acontece, na definição sociológica, que é de desvio do mandato público."
As pressões políticas e o assédio, diz, empurram os policiais para a irregularidade, a
barganha e os negócios informais. "Não há "accountability"
[prestação de contas]. Como
posso responsabilizar alguém
se as regras do jogo estão abertas? O policial tem vários patrões, e cada procurador foge
com sua procuração. Estão
abertos ao improviso. O PM se
preocupa se está agradando ao
coronel, à milícia, ao político.
Vive entre a cruz e a caldeira.
Indigente, mendicante, a polícia recebe migalhas para continuar dependente."
Descontrole
A antropóloga afirma que a
situação deixa os PMs "algemados" e gera descontrole.
"Quem tem controle? O secretário? O governador de fato
manda? É a privatização do
mandato: o PM é o Estado ambulante nas ruas. Quando atira,
é o governador atirando. Tem
de ter autonomia diante dos
grupos de pressão para prestar
contas e não ser vulnerável. Ou
fabrica saldos operacionais para salvar a carreira. Alguém nega o pedido de um policial?
Ninguém melhor que o agente
da lei para o governo paralelo."
Pela ausência de regras objetivas, explica Muniz, os mecanismos de controle interno da
corporação "são muito mais decorativos que funcionais". "Não
tem termos concretos. Por
mais que a Corregedoria e a
Ouvidoria possam agir, esbarram na ausência de regras."
Na opinião da pesquisadora,
"ignora-se que o policial da esquina é o principal tomador de
decisões". "É visto como soldado, e não como executivo de Segurança Pública. Negamos sua
autoridade e discricionariedade. Tem de decidir instantaneamente: "Atiro ou não, recuo
ou avanço?". São decisões que
não se adiam. E, quando se nega
essa autoridade, esse PM é o
mais frágil, inseguro."
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