São Paulo, domingo, 19 de março de 2006

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Inédito - de Robert Louis Stevenson

Leia uma fábula desconhecida do autor de "A Ilha do Tesouro" e "O Médico e o Monstro" descoberta recentemente no Reino Unido e que faz uma sátira do conhecimento científico

LEONARDO FRÓES
ESPECIAL PARA A FOLHA

Mais de um século depois de escritas, só agora estão sendo publicadas, mesmo em inglês, duas fábulas em que Robert Louis Stevenson criticou com sarcasmo a ciência de sua época: "O Macaco Cientista" e "O Relojoeiro". Por razões obscuras, ambas foram excluídas do conjunto de 22 que seu amigo Sidney Colvin preparou para edição e lançou em 1895, ano seguinte ao do morte do autor.
Pouco também se sabe sobre a composição das "Fables" [Fábulas], título do livro organizado por Colvin, onde o espírito satírico, tão típico das literaturas britânica, irlandesa e escocesa, é uma constante.
Sabe-se, porém, que o próprio Stevenson, poucos anos antes de morrer, teve a intenção de publicá-las, pois chegou a se entender com uma editora e a assinar um contrato. Localizadas na coleção Beinecke de manuscritos, onde seus originais se preservam na Universidade Yale, as duas fábulas adormecidas por décadas decerto serão agora incluídas nas novas reedições da coletânea.
Amigos e parentes que escreveram depoimentos sobre Robert Louis Stevenson são unânimes em considerá-lo uma pessoa incomum, tocada pela graça da vida. E quase todos insistem no contraste entre o fulgor de seus olhos e a impressão de desamparo do corpo.
Ele era um esqueleto ambulante. Filho único de uma família burguesa de Edimburgo, foi doentio desde a infância. A tuberculose o rondou. A duras penas, desistindo de se tornar engenheiro, como o pai, o tio, o avô, formou-se em direito na universidade local, mas nunca exerceu a profissão. Parecia, ainda menino, viver apenas de poesia. Fugindo do céu de chumbo da Escócia, esteve sempre à procura de sol. Muitas vezes, cuspia sangue. Mas nem por isso abandonou o cigarro. Passou longas temporadas nas colônias de artistas do sul da França, onde conheceu a americana mais velha e já casada que se tornou depois sua mulher.

Todo bondade
Fez teatro amador na adolescência. Fazia poses e usava roupas inventivas. Dizem também que era todo bondade. Que não só dava o melhor de si nos encontros como também tinha pendor e tato para extrair o melhor de cada um.
Já conhecido pelos primeiros contos e por seus artigos na imprensa, Louis, como os amigos o chamavam, se tornou famoso e rico aos 33 anos, quando publicou "Treasure Island" ("A Ilha do Tesouro", 1883) e, logo a seguir, o outro de seus numerosos livros que permaneceu sempre um clássico: "Dr. Jekyll and Mr. Hyde" ("O Médico e o Monstro", 1886). Em 1890, fixou-se em Samoa, no Pacífico, onde instalou grande família -sua mãe, sua mulher, os filhos dela e uma porção de agregados- na mansão de Vaimilia.
Em 1894, quando aí trabalhava no que muitos acham sua obra-prima, o romance inacabado "Weir of Hermiston" [O Dique de Hermiston], o Tusitala -ou "contador de histórias", como os nativos o chamavam- morreu de hemorragia cerebral, aos 44 anos.
Sidney Colvin, num livro de memórias que publicou depois, diria ter conversado com os médicos que se ocuparam de Louis. O problema do escritor, segundo suas averigüações, não era a escassez de sangue, mas um excesso de vitalidade. Os médicos teriam dito que o coração do Tusitala, um coração afetuoso, era grande demais para a fragilidade do corpo, bombeando assim uma energia que ele não podia agüentar.


Leonardo Fróes é escritor, poeta e tradutor, autor de "Chinês com Sono Seguido de Clones do Inglês", "Contos Orientais" e "Vertigens" (todos pela ed. Rocco), entre outros.


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