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As categorias de Arendt
Coletânea
de artigos esmiúça
os principais conceitos
da pensadora,
como "banalidade
do mal"
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CELSO LAFER
ESPECIAL PARA A FOLHA
Entre o Passado e o Futuro" é o título do primeiro livro de Hannah Arendt publicado
no Brasil. É um conjunto de ensaios que ela qualificou como exercícios do pensamento político.
A obra é o fruto, como diz no
prefácio, da interação entre experiência vivida e pensamento.
Tem a característica de ser altamente representativo da maneira pela qual Hannah Arendt
[1906-75] abriu novos horizontes para a reflexão política no
século 20.
"Hannah Arendt - Entre o
Passado e o Futuro" é o título
do conjunto de estudos dedicados ao seu pensamento organizado por Adriano Correia e
Mariangela Nascimento. É um
título muito apropriado porque os ensaios reunidos no livro são exercícios sobre o pensamento político de Hannah
Arendt. Estão voltados para
trabalhar o significado e o alcance das categorias que ela
elaborou para lidar com o ineditismo das rupturas históricas
trazidas pelo século 20.
Essas categorias são um movimento complexo de recuperação e reformulação da tradição do pensamento político,
como lembra Newton Bignotto
no prefácio em que discute a
presença e a recepção da obra
arendtiana. Propiciaram um
léxico próprio, de que são
exemplos termos como mal radical, banalidade do mal, totalitarismo, trabalho, obra, ação,
"amor mundi", natalidade, pluralidade, esfera pública.
Neste sentido, aponto que o
primeiro mérito deste livro é o
de ser uma substantiva contribuição para a compreensão do
vocabulário arendtiano, voltado para pensar e lidar com os
acontecimentos sem o apoio do
corrimão dos sistemas que se
revelaram insubsistentes.
Adriano Correia é um estudioso de primeira linha de
Hannah Arendt. É responsável
pela organização de dois livros
anteriores sobre sua obra e autor de uma primorosa e sintética introdução ao seu pensamento. Neste volume, trata da
decisiva relação entre natalidade e "amor mundi" no percurso
reflexivo arendtiano, rastreando com percuciência a sua matriz em santo Agostinho, sobre
quem Hannah Arendt escreveu
a sua tese de doutoramento.
Carmelita Brito de Freitas
Felício examina como Arendt
trabalhou o kantiano conceito
do direito à hospitalidade universal à luz da experiência dos
refugiados e da persistência do
problema na agenda internacional, apontando afinidades
entre a autora e [o filósofo
francês Jacques] Derrida.
Mariangela M. Nascimento
explora as reflexões arendtianas sobre a esfera pública, como a confluência das falas e do
agir humano, e aponta a sua relevância para a discussão da democracia no Brasil.
Estamos no mundo
Theresa Calvet de Magalhães, que é uma grande conhecedora da obra de Hannah
Arendt e colaborou com Adriano Correia na revisão técnica
da admirável tradução por ele
empreendida do texto arendtiano "Trabalho, Obra, Ação",
analisa, no percurso reflexivo
arendtiano, por que cabe afirmar que "estamos no mundo e
não somos apenas do mundo".
Isso exige criar, politicamente,
uma confiança no mundo para
ir além do "névoa-nada" do
"Eclesiastes".
Maria de Fátima Simões
Francisco faz uma sutil análise
de como Hannah Arendt, para
se contrapor à tradição do pensamento político que se inicia
com Platão e que subordina o
agir ao pensar, constrói a razão
de ser da "polis" grega como espaço público, tendo como ponto de partida a oração fúnebre
de Péricles. Indica como a
apropriação seletiva empreendida por Arendt, de ingredientes da "vita activa" no mundo
grego, tem inspiração na "Ilíada" e não na "Odisseia" porque
esta trata do retorno à esfera
doméstica, depois dos feitos
públicos da Guerra de Troia.
Vinícius Silva de Souza discute o conceito de liberdade em
Hannah Arendt como uma atividade da vida política e não como uma expressão do livre arbítrio da consciência.
Rosângela Chaves examina
como a análise arendtiana do
antissemitismo moderno, enquanto cristalização de elementos que vieram a se configurar no totalitarismo, tem, entre seus ingredientes, uma sutil
leitura da obra de Proust.
O fecho do volume é de Bethânia Assy, outra grande estudiosa da obra de Hannah
Arendt, a quem se deve a percuciente introdução à edição brasileira de "Responsabilidade e
Julgamento" [Cia. das Letras].
Bethânia Assy explora o "distinguo" arendtiano entre o que
somos e quem somos indicando como o "quem somos" é a
base da singularidade da personalidade ética.
Os desafios da compreensão
da política no século 20 instigaram a reflexão de Hannah
Arendt. O seu vocabulário é
uma expressão disso, pois busca propiciar o inter-relacionamento entre compreensão e
conhecimento. Este livro é uma
contribuição de qualidade para
o entendimento da grande obra
de Hannah Arendt, na qual se
mesclam, de maneira superior,
conhecimento e compreensão.
CELSO LAFER é ex-ministro das Relações Exteriores do governo FHC e autor de "Hannah
Arendt - Pensamento, Persuasão e Poder" (Paz
e Terra), entre outros livros.
HANNAH ARENDT - ENTRE O
PASSADO E O FUTURO
Organização: Adriano Correia e Mariangela Nascimento
Editora: Editora da Universidade Federal de Juiz de Fora (tel. 0/xx/32/3229-7646)
Quanto: R$ 20 (150 págs.)
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