São Paulo, domingo, 21 de março de 2004 |
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Desenvolvimento como imperativo econômico
O PRESIDENTE DO BNDES ALERTA QUE A PERSISTÊNCIA DAS
ALTAS TAXAS DE DESEMPREGO PODE COLOCAR EM RISCO A
DEMOCRACIA E PEDE A RETOMADA DO DESENVOLVIMENTISMO
Antes de perguntarmos por que nós, nos governos dos dois fernandos, tomamos a trilha neoliberal, devemos perguntar por que os europeus ocidentais, sem os nossos constrangimentos de dívida externa, inauguraram esse caminho? Não adianta procurar respostas no terreno econômico, pois não há: o neoliberalismo nunca chegou a ter status acadêmico, e a teoria neoclássica, de que se serve nos principais aspectos, já estava perdendo o seu no mesmo momento em que a doutrina escalava. Próprio interesse A resposta é de natureza sociológica: grande parte do corpo político dos países industrializados avançados se inclinou para políticas neoliberais e conservadoras pelo simples fato de que essas políticas atendiam a seus interesses. Ou seja, os afluentes, ricos, aplicadores líquidos de dinheiro se tornaram maioria no corpo político -ou pelo menos determinantes de sua inclinação. Esses afluentes queriam que sua riqueza tivesse valor internacional. Nada diferente de muitas famílias da Barra, no Rio, ou dos Jardins, em São Paulo, que também querem se dolarizar. Essas forças sociais e políticas européias se alinharam às classes dominantes financeiras para abolir todo o controle de capitais. Com câmbio flutuante, isso naturalmente acentua a instabilidade dos mercados. Foi justamente para controlar essa instabilidade que os governos recorreram a políticas fiscais e monetárias restritivas, sacrificando o crescimento e o emprego. Assim, a globalização não é um produto do neoliberalismo, mas da pressão dos afortunados para internacionalizar sua riqueza; o neoliberalismo, sim, é a forma de compatibilizar liberdade de capitais e câmbio flutuante com estabilidade monetária interna. Recado nas eleições É no meio desse fogo cruzado que nos encontramos. No transcurso, nos tornamos uma democracia de cidadania ampliada, com uma performance espetacular em termos de exercício de direitos políticos. Contudo, ao contrário dos europeus ocidentais, os afluentes não são maioria no nosso corpo político. São minoria. A abertura irresponsável dos dois fernandos atendeu aos interesses objetivos dessa minoria, deixando à maioria o ônus da maior crise social da nossa história, sinalizada por taxas de desemprego sem precedentes. Por certo, essa maioria claramente deu seu recado nas eleições de 2002. Qual é o nó da questão para os próximos anos? Certamente, não continuaremos a ser uma democracia estável se persistir a crise de alto desemprego. Temos que retomar o desenvolvimento a altas taxas, seguir a trilha que países asiáticos como Índia, China, Coréia do Sul, Taiwan e outros estão percorrendo. Para isso é essencial resgatar a capacidade de investimento e de poupança real do Estado. E é fundamental, também, a atuação de instituições financeiras públicas, como o BNDES, força ancilar do desenvolvimento brasileiro desde os anos 50. Em uma palavra, retomar o desenvolvimentismo, abandonando o delírio ideológico de que o mercado globalizante, deixado a si mesmo, vai nos resgatar. Carlos Lessa é economista, presidente do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) e ex-reitor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). É autor de "Quinze Anos de Política Econômica", "O Rio de Todos os Brasis" (ed. Record) e "Auto-Estima e Desenvolvimento Social" (ed. Garamond), entre outros. Texto Anterior: O colapso do desenvolvimento Próximo Texto: Transição inacabada Índice |
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